OPINIÃO

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Entrou em vigor no dia 1º de novembro deste ano a Instrução Normativa (IN) nº 2.110 da Receita Federal, de outubro de 2022, que dispõe sobre normas gerais de tributação previdenciária e de arrecadação das contribuições sociais destinadas à Previdência Social e, dentre outras, culminará com a revogação da IN 971/2009.

Dentre as principais alterações normativas, destacamos as previsões expressas sobre verbas que não integram a base de cálculo de contribuições previdenciárias, como são os casos dos: 

— auxílio-alimentação, oferecidos em forma de tíquete refeição ou congêneres, ainda que pagos antes da Reforma Trabalhista, que inclui o §2º do artigo 457 da CLT ;
— parcela do vale-transporte paga em dinheiro, desde que se limite ao valor necessário para o deslocamento por meio de transporte coletivo de passageiros;
— salário-maternidade;
— aviso prévio indenizado, mas sem estender ao reflexo na gratificação natalina;
— remuneração paga ao empregado nos 15 dias que antecedem o auxílio por incapacidade temporária;
— abono-assiduidade que seja pago em forma de pecúnia.

Entretanto, a referida instrução normativa, em razão da revogação do disposto na IN 971/09 da RFB, também esmiúça a aplicação das regras de custeio da sinistralidade acidentária das empresas em razão do disposto no artigo 22, inciso II da Lei nº 8.212/91 e artigo 202 do Decreto 3.048/99, nos quais se determina a tributação sobre o total das remunerações pagas ou creditadas aos segurados empregados e trabalhadores avulsos, mediante a aplicação das alíquotas de 1%, 2% ou 3% (GIIL — RAT),  que variam em razão do grau de risco de cada estabelecimento comercial de acordo com a atividade preponderante desempenhada segundo as estatísticas do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

O GIIL-RAT é a sigla correspondente à Contribuição do Grau de Incidência de Incapacidade Laborativa decorrente dos Riscos Ambientais do Trabalho, uma das várias contribuições previdenciárias obrigatórias previstas em nosso ordenamento jurídico.

A referida contribuição, prevista constitucionalmente no artigo 7º, inciso XXVIII, foi concebida para custear benefícios decorrentes de acidentes de trabalho e/ou doenças ocupacionais e as aposentadorias especiais, pois todos decorrentes da exposição do trabalhador aos riscos ocupacionais acima dos limites estabelecidos nas Normas regulamentadoras — NRs ou que lhes causem alguma incapacidade laboral, tudo na forma do artigo 22, inciso II, da Lei 8.212/91.

É exatamente nesse aspecto específico da tributação previdenciária sobre folha de pagamento que muitos estabelecimentos acabam cometendo equívocos interpretativos capazes de gerar risco de autuação em razão de contribuição menor, ou gerando prejuízo aos cofres das empresas, em razão de recolhimentos em valores superiores ao devido.

Neste sentido, prevê a Instrução Normativa 2.110 de 2022 da Receita Federal que "o enquadramento da atividade nos correspondentes graus de risco é de responsabilidade da empresa, e deve ser feito mensalmente, com base em sua atividade econômica preponderante, observados o código da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) da atividade e a alíquota correspondente ao grau de risco".

A situação gera algum tipo de confusão, principalmente, nos casos em que no mesmo estabelecimento coexistem mais de uma atividade econômica. Qual deveria ser tratada como preponderante? E, nesse aspecto, a instrução normativa é bastante clara ao estabelecer que a empresa deverá simular o enquadramento em cada atividade e prevalecerá, como preponderante, aquela que tem o maior número de segurados empregados e trabalhadores avulsos.

A atividade econômica preponderante, portanto, não se confunde com a atividade econômica principal da empresa. Enquanto a primeira está voltada para aspectos laborais (número de segurados empregados e trabalhadores avulsos na atividade econômica), a segunda tem como foco aspectos econômicos, conforme artigo 17 da IN RFB nº 1.436, de 30 de dezembro de 2013.

Assim, no que diz respeito ao GIIL-RAT, para o enquadramento nos correspondentes graus de risco do estabelecimento, seja ele matriz ou filial, o interessado não utilizará a atividade econômica principal, mas a atividade preponderante, nos termos da IN RFB nº 2.110/2022.

Cada estabelecimento da empresa, seja ele matriz ou filial, deverá verificar a atividade preponderante ali desempenhada e esta verificação não terá consequências em relação ao código Cnae principal da empresa e nem demanda alteração de objeto social.

Em outras palavras, a "atividade econômica preponderante" para fins de recolhimento da alíquota do RAT não se confunde com a "atividade-fim empresarial" que define o código Cnae principal. Esse posicionamento já foi exposto nas Soluções de Consultas nº 28/2020 (Cosit), nº 4.032/2019 (Disit), nº 4.013/2018 (DISIT), nº 1.014/2018 (Disit), nº 677/2017 (Cosit), nº 90/2016 (COSIT) e nº 78/2015 (Cosit). E, todas as atividades exercidas dentro de um estabelecimento por seus colaboradores devem ser consideradas e mensuradas para fins de atribuição da atividade preponderante empresarial.

Na redação dada pela Instrução Normativa RFB nº 1.080, de 2010, havia uma previsão de desconsideração dos segurados empregados que prestam serviços em atividades-meio (serviços de administração geral, recepção, faturamento, cobrança, contabilidade, etc) para a apuração da atividade econômica preponderante. Tal previsão, entretanto, foi suprimida pela IN RFB nº 1.453, de 2014 e a situação não está ressalvada na IN 2.110/2022. Assim,  se conclui que os segurados empregados que prestam serviços em atividades-meio deverão ser considerados na apuração da atividade econômica do estabelecimento.

Portanto, a informação prestada pelo estabelecimento, seja na GFIP ou no e-Social, para fins de cumprimento das obrigações tributárias acessórias, deve estar de acordo com o enquadramento da empresa ou de cada um dos seus estabelecimentos no correspondente grau de risco, e deve ser feito mensalmente, de acordo com sua atividade econômica preponderante, que independe da sua atividade principal.

Outro aspecto importante, que também gera muita confusão, é relacionado com a metodologia de apuração e Aplicação do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) em conjunto com o GIIL-RAT.

Em fevereiro de 2007, por meio do Decreto nº 6.042, ocorreu a alteração da redação do Decreto nº 3.048/99 para disciplinar a aplicação, acompanhamento e avaliação do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) e do Nexo Técnico Epidemiológico. A partir desse momento a sistemática contributiva do GIIL-RAT sofreu importante modificação, na medida em que os critérios individuais de um determinado estabelecimento passaram a viabilizar a redução ou majoração do tributo devido.

Assim, o fato é que, com o argumento de estimular a adoção de políticas empresariais voltadas às melhorias do meio ambiente do trabalho através de ações de Medicina, Segurança, Saúde e Higiene do Trabalho, a partir de 2010 o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) alterou as regras de fixação de alíquotas do GIIL-RAT.

O FAP é, portanto, um multiplicador variável aplicado sobre a alíquota base do RAT de cada estabelecimento da empresa conforme a sua auto-declaração de atividade econômica, o qual, por sua vez, é estabelecido conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae) e o quadro anexo ao Regulamento da Previdência Social.

Na composição do FAP, o INSS leva em consideração, principalmente, os acidentes e doenças relacionadas ao trabalho que tenham como resultado o efetivo pagamento de benefícios acidentários, os quais são capazes de gerar custos aos cofres públicos.

Portanto, segundo a nova lógica de tributação de GILL-RAT, em que pese a alíquota-base ser a mesma para as empresas que desempenhem uma mesma atividade econômica preponderante ("mesmo Cnae"), aquelas com histórico de concretização dos "sinistros" cobertos pelo tributo devem responder em maior grau no custeio, seja por meio da não aplicação de bonificação (FAP > 0,5000), seja pela aplicação da majoração do tributo (FAP malus > 1,0000).

Uma empresa com FAP 2,000 e GIIL-RAT 3% terá o RAT-ajustado total de 6%. Este é o tributo a incidir sobre a folha de pagamento. Já outra empresa que tenha o FAP 0,5000 e o GIIL-RAT 3%, terá o RAT-ajustado de 1,5%. Esta é a lógica deste tributo.

O FAP é calculado anualmente, sendo oportunizado prazo para que as empresas contestem os critérios utilizados pelo Ministério da Economia e Previdência, com vistas a corrigir eventuais distorções na apuração desse multiplicador. Esse momento ocorre no mês de novembro de cada ano.

Muitas empresas sequer monitoram a aplicação correta do FAP e menos ainda contestam efetiva e corretamente os critérios apurados pelo Estado. Fatos que acabam gerando, igualmente, recolhimentos previdenciários divergentes do efetivamente devidos.

Em suma, a metodologia de aplicação do FAP-RAT ainda está muito aquém do ideal de conhecimento interno nos departamentos empresariais e uma verdadeira fortuna em potencial pode estar sendo desperdiçada ou em vias de atingir os cofres das empresas em razão de fiscalizações da receita.

 é graduado em Direito pelo Mackenzie, pós-graduado em Direito Previdenciário pela Unisal, mestre em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela USP, advogado atuante nas áreas trabalhista e previdenciária empresarial, palestrante, instrutor in company, docente convidado em instituições privadas (ESA Nacional, ESA São Paulo, Futurelaw, Mizuno Class e DVW Treinamentos), sócio fundador do escritório Pallotta, Martins e Advogados, autor do livro "Contratação na Multidão e a Subordinação Algorítmica", além de capítulos em livros de Direito do Trabalho e artigos para sites e revistas especializadas.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2022-nov-20/mauricio-pallotta-sinistralidade-acidentaria-custeio-previdenciario