Na semana passada, o colegiado subiu os juros de 13,25% ao ano para 13,75% ao ano

Por Alex Ribeiro, Estevão Taiar e Guilherme Pimenta, Valor — São Paulo e Brasília

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central disse, em ata da sua última reunião, divulgada nesta manhã, que seguirá “vigilante e avaliará se somente a perspectiva de manutenção da taxa básica de juros por um período suficientemente longo assegurará” a convergência da inflação para a meta no primeiro trimestre de 2024.

Na semana passada, o colegiado subiu os juros de 13,25% ao ano para 13,75% ao ano e sinalizou que poderá encerrar em setembro o ciclo de aperto monetário, com a possibilidade de uma alta “residual” de 0,25 ponto percentual na meta da taxa Selic.

A ata, que detalha as discussões desse encontro, diz que o Comitê seguirá atento à evolução da inflação para ratificar o fim do ciclo de aperto monetário, “dada a persistência dos choques” que afetam o índice de preços ao consumidor.

“O Comitê notou que a dinâmica inflacionária de curto prazo segue desafiadora, com avanço das medidas de inflação subjacente em ambiente de surpresas na atividade corrente, e que suas projeções seguiram se deteriorando, ainda que o cenário esteja cercado de incerteza e volatilidade acima do usual”, diz a ata do Copom. “Ressaltou-se que a elevação das expectativas e das projeções de médio prazo se concentrou na inflação de preços administrados, em função do caráter temporário de algumas medidas tributárias.”

O documento detalha as discussões do colegiado sobre como as recentes medidas de expansão fiscal do governo Bolsonaro poderão afetar a demanda agregada e dificultar o trabalho desinflacionário feito com as altas recentes de juros, que atuam para esfriar a economia e conter o avanço dos preços.

Segundo a ata, os impactos da alta de juros “devem ficar mais claros nos indicadores de atividade referentes ao segundo semestre”. Mas o Copom cita o vento na direção contrária do corte de impostos e do aumento das transferências de renda feitos recentemente pelo governo: “medidas de sustentação da demanda agregada, que serão implementadas no curto prazo, devem dificultar uma avaliação mais precisa sobre o estágio do ciclo econômico e dos impactos da política monetária”.

O colegiado, mostra a ata, fez uma longa discussão sobre o grau de aquecimento da economia, que tem surpreendido, com um mercado de trabalho mais forte do que o esperado. Segundo o colegiado, a economia opera com uma ociosidade menor do que a esperada. Embora seja algo bom para o emprego e a renda, isso dificulta o esforço desinflacionário do BC.

“Os dados referentes ao mercado de trabalho, em especial o volume de contratações e a taxa de desocupação, surpreenderam no período e indicam um estreitamento da estimativa do hiato do produto mais célere que o antecipado”, diz a ata, usando o jargão dos economistas para o nível de ociosidade. “Entretanto, o Comitê avalia que ainda há ociosidade na economia.”

Os membros do colegiado também enfatizaram que é difícil a leitura do grau de ociosidade da economia. “Nota-se que avaliações sobre o hiato, especialmente no que tange ao componente ligado ao mercado de trabalho, estão sempre sujeitas à incerteza, especialmente em uma conjuntura como a atual em que a economia ainda se normaliza após a pandemia e onde há notável heterogeneidade setorial nesse processo”, diz a ata.

O Copom informa que “seguirá acompanhando e analisando o hiato do produto à luz das próximas divulgações” e manteve a sua visão de que “a atividade deve desacelerar nos próximos trimestres, quando os impactos defasados da política monetária se fizerem mais presentes”.

O colegiado, porém, ponderou não apenas sobre o risco de as medidas fiscais do governo afetarem a atividade ao longo do segundo semestre, mas também sobre os riscos de novas medidas a serem adotadas pelo governo a ser eleito em outubro.

“O Comitê avalia que políticas temporárias de apoio à renda devem trazer estímulo à demanda agregada e que o prolongamento de tais políticas pode elevar os prêmios de risco do país e as expectativas de inflação à medida que pressionam a demanda agregada e pioram a trajetória fiscal”, diz a ata. “O Comitê reitera que há vários canais pelos quais a política fiscal pode afetar a inflação, incluindo seu efeito sobre a atividade, preços de ativos e expectativas de inflação.”

O Banco Central age para baixar a inflação, que chegou a 10,07% no acumulado em 12 meses até julho, para o intervalo entre as meta de 3,25% em 2023 e de 3% em 2024. As projeções do Banco Central apontam, porém, que com os juros em 13,75% ao ano definidos na reunião da semana passada, ainda não é possível chegar lá.

A autoridade monetária projeta uma inflação de 6,8% neste ano, bem acima do centro da meta, de 3,5%. Como as altas de juros levam cerca de um ano e meio para atingir o efeito máximo na inflação, não há muito o que o Copom possa fazer para evitar o estouro do teto da meta deste ano, de 5%. Isso provavelmente obrigara o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a escrever uma carta aberta explicando os motivos.

Com os mesmos juros de 13,75% ao ano, mas que caem para 11% ao fim de 2023, o Banco Central projeta uma inflação de 4,6% para o ano que vem, também muito próximo do teto da meta. Em tese, a política monetária teria força para baixar mais a inflação do ano que vem em direção ao centro da meta.

Mas, em comunicado divulgado na semana passada, o Copom argumentou que a inflação de 2022 e 2023 estavam muito impactadas pelos cortes de impostos patrocinados pelo governo Bolsonaro, que baixam a inflação no primeiro ano mais elevam a inflação no ano seguinte.

Por isso, a estratégia anunciada foi “dar ênfase à inflação acumulada em 12 meses no primeiro trimestre de 2024, que reflete o horizonte relevante, suaviza os efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora seus impactos secundários sobre as projeções de inflação relevantes para a decisão de política monetária”.

Para esse período de 12 meses até março de 2024, o Copom projeta uma inflação de 3,5%. O índice está acima da meta tanto de 2023 (3,25%) quanto de 2024 (3%), mas o colegiado considera que o percentual “é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante”.

O argumento do Banco Central é que, atualmente, o cenário é mais incerto que de costume, o que faz com que sejam grandes as chances de a inflação ficar tanto acima do projetado quando de ficar abaixo dele.

O Banco Central diz que o seu balanço de riscos é simétrico, equilibrando tanto fatores de riscos altistas quanto baixistas para a inflação. Do lado de baixa, o comitê cita as chances de reversão das altas dos preços das commodities internacionais, expressas em reais. Também menciona as chances de uma desaceleração mais forte que o esperado da atividade econômica.

Sobre esse último risco, a ata do Copom detalha uma discussão do colegiado sobre um possível efeito da desaceleração global sobre a economia brasileira. “Dada a persistência do processo inflacionário nas economias avançadas e as consequentes reações de vários bancos centrais, o comitê avalia que houve um aumento da probabilidade de cenários alternativos que incorporam uma desaceleração da atividade global mais pronunciada”, diz a ata. “Concorrem nesse sentido a incerteza sobre o cenário de energia na Europa, a dinâmica de setores mais sensíveis a juros nos Estados Unidos e as perspectivas de crescimento mais gradual na China.”

Do lado dos riscos negativos, o Copom citou a possibilidade de uma maior persistência nas pressões inflacionárias globais e também “a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais adicionais que impliquem sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos”.

VALOR INVESTE

https://valorinveste.globo.com/mercados/moedas-e-juros/noticia/2022/08/09/ata-aponta-que-copom-seguira-vigilante-e-podera-subir-mais-os-juros.ghtml


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