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Globo Repórter: Construção civil é área que mais abre empregos, inclusive para mulheres



Uma mulher e um homem. Lusivaldo da Costa e Dacilene Cristina Salles nem se conhecem, mas tem planos parecidos. Assim como o caminho para construí-los. Empregos com carteira assinada e muito suor, em canteiros de obras. A turma da Dacilene anuncia os novos tempos neste tipo de ambiente.



"Uma área que está dando dinheiro para mulher é a construção civil ", disse Dacilene.



Dacilene tem razão. A construção civil é a área que está abrindo mais empregos, no Brasil. Inclusive para as mulheres.



"Ainda não achei nenhum canteiro que faltasse com respeito com a gente, porque tem assédio", contou Dacilene.



Dacilene tem 35 anos, ex-atleta, mãe de família. Hoje, levantando prédios e derrubando preconceitos. Dacilene explica o serviço de uma profissional como ela. Uma carpinteira de forma.



"Nós trabalhamos com montagens de formas de pilar, colagem, depois que vem a ferragem e aí depois que vem a alvenaria. É bem a base da construção", explicou Dacilene.



Trabalho pesado. Mas compensador, disse Dacilene.



A equipe do Globo Repórter foi até uma comunidade do Rio, a Vila Cruzeiro, para ver o que vai mudando na vida da Dacilene. Ela está morando provisoriamente na casa de uma tia. Mas o emprego já permite sonhar com casa própria.


"Eu vou dar preferência de comprar um terreno e fazer a casa do jeito que eu quero. Estou com umas reservas, guardando um pouquinho no porquinho", disse Dacilene.



Juntando aos pouquinhos e pesquisando muito antes de qualquer gasto maior. Cautelosa, apesar das portas que o emprego formal acaba abrindo.



"A melhor coisa que tem na vida é a carteira assinada, quando você consegue um trabalho. Você entra numa loja, pedem a carteira, teu contra-cheque, tendo tudo direitinho, você consegue crédito, você já é bem tratada na loja. O sonho da minha filha era um notebook e eu comprei", afirmou Dacilene.



"Ela" é Diana Salles de Sousa, a filha de 15 anos.



"É bom ter uma mãe carpinteira. Eu gosto. É difícil ter mulher nesta profissão. Pra mim é orgulho. O povo da escola não acredita", disse a filha da Dacilene, Diana.



"O pai dela mesmo falou ‘tua mãe não está fazendo isso não, garota’. ‘Está, pai, e ainda ganha mais do que o senhor’. Hoje em dia, eu estou ganhando seis vezes mais do que eu ganhava antigamente", revelou Dacilene.



O trabalho antigo, arriscado e mal remunerado, era no Centro do Rio.



Dacilene ajudava a fabricar e vender bolsas. Na rua. Sem carteira nem segurança. E com muitos sobressaltos. Aquela eterna correria fugindo da fiscalização.



"Toda hora é adrenalina. Você, do nada, tem que ficar uma pessoa olhando pra ver se o ‘rapa’ está chegando", contou.


A hora de mudar veio com um curso noturno de carpintaria. A correria, agora, é outra.



"A solução que o mercado está encontrando é isso: formar profissionais masculinos e femininos. Quem diria que da parte de estrutura, que é a parte mais pesada, a gente teria mulheres trabalhando?", questionou o engenheiro José Zidde.


“Introduzir as mulheres, tem que ter estrutura para isso?”, perguntou o repórter Alberto Gaspar.


“Logicamente, que banheiros separados, vestiários”, respondeu o engenheiro.


"Primeira vez que eu vejo em obra. Mulher trabalhar. Primeira vez. É muito legal", revelou o carpinteiro Eduardo da Silva.


"Torna o ambiente mais suportável. Mais agradável. Você vê que isso daí é uma prova que realmente, precisa de mão de obra. Sem sombra de dúvida é o melhor momento que já vi", ressaltou José Zidde.



Em Triagem, bairro da Zona Norte do Rio, estão sendo construídos 112 prédios


com 2240 apartamentos populares. Sonhos de casa própria erguidos, concretizados, pelas mãos de quase mil trabalhadores. Gente que, com este trabalho, também tem a chance de erguer, de realizar, seus próprios sonhos.



A fase é de ritmo acelerado. Resta pouco tempo.


"Faltam duas semanas para entregar a obra. Tem que correr", revelou o encarregado de obras Lusivaldo da Costa.



Pedreiro experiente, Lusivaldo chegou a se afastar da profissão por falta de oportunidades. Mas voltou com tudo, nos últimos anos. Agora é encarregado. Toma conta do serviço de um batalhão.


Ele fiscaliza os prazos e a qualidade do trabalho. E presta atenção nos novatos que tem sido muitos.



"Eu pego eles, experimento aqui. Se não der certo, aqui nós não dispensamos operário, a gente vai experimentando onde ele vai se encaixar melhor", explicou Lusivaldo.



“Você está aqui há duas semanas? Você estava fazendo o que antes?”, perguntou Gaspar.



"Antes eu estava desempregado. Minha profissão é mecânica. Passei da mecânica para a construção civil", respondeu o pintor Ademar Cardoso do Carmo.



“Você também tem inclusive que ver quem se dá melhor em cada área?”, perguntou Gaspar.



"Em cada área”, respondeu Lusivaldo.



Responsabilidade grande. E espalhada por uma área enorme. Haja fôlego.



"Ando uma faixa de dez quilômetros, para mais, por dia. É muito grande e tem que subir todos os apartamentos, todos os andares”, contou Lusivaldo.



Mas subir na vida é o que impulsiona o mineiro de 39 anos, casado, pai de quatro filhos.


“O teu próximo sonho qual é?”, perguntou Gaspar.



"Ser engenheiro. Estou estudando”, respondeu Lusivaldo.



Depois de 22 anos sem entrar numa sala de aula, Lusivaldo fez supletivo, terminou o ensino médio e entrou na faculdade. No alojamento da obra, além de descansar, ele busca o tempo perdido. E não é só isso.


Sexta feira à noite, na rodoviária do Rio. Na verdade, já é sábado. Nossa equipe foi encontrar com o Lusivaldo que, depois de uma semana de trabalho, está indo para a escola. Pra faculdade. Ele vai pra casa também. Não é nada perto. São uns 450 quilômetros até Belo Horizonte.



"É um pouco cansativo, mas a gente está aí para encarar os desafios”, afirmou Lusivaldo.



Ele precisa dormir pra encarar a aula no dia seguinte. Por isso o papo da equipe do programa com ele precisou ser rápido. Lusivaldo explica que é de Minas, mas a proposta de trabalho no Rio era muito boa, daí ter entrado nesse vai-e-vem.



"Já estou no segundo ano. Não posso largar. Meu ânimo para ir e voltar é que vou estudar, ver os filhos e ainda trabalhar um pouco no domingo”, contou


Quanta disposição. Se dependesse dele, passaríamos a noite acordados.



Nossa equipe e Lusivaldo amanheceram em Belo Horizonte. O encontro foi marcado na faculdade do Lusivaldo. Ele cursa Engenharia Civil na PUC, a Pontifícia Universidade Católica de Minas.



Mas no encontro com a professora, as noticias não foram boas. Lusivaldo perdeu o semestre. Estourou o limite de faltas na matéria.


"Eu teria que vir a duas aulas na semana, mas estava vindo a uma só, no sábado”, disse Lusivaldo.


Pior ele também perdeu a bolsa que pagava metade da mensalidade.



"Eu acho que ele é um bom aluno, porque o aluno que procura e tem boa vontade de querer fazer e tentar fazer, eu já acho que é um passo muito importante que ele está dando na vida dele”, revelou a engenheira e professora Angélica Cristina de Ezequiel Teixeira.



Mas não tem tempo ruim para o Lusivaldo. Ele vai tentar transferência para uma faculdade no Rio de Janeiro.



"Vai dar certo. Se deus quiser e ele, com esta força de vontade que ele está tendo. Desejo boa sorte para você, Lusivaldo. E não desista, persista”, afirmou a professora.



É. De volta ao trabalho. Mas esse não é naqueles apartamentos, não. É particular. Na casa do Lusivaldo, em Belo Horizonte. Obra familiar. A meninada dá uma forca. Em troca, os filhos ganham o exemplo.



"Eu brinco com os meus meninos que ‘Meu nome é trabalho. Sobrenome hora extra. Codinome, produção’”, contou Lusivaldo



Todos vão ganhar também mais espaço na casa apertadinha, de fundos. O projeto está todo na cabeça do futuro engenheiro.



“A área que você tem sua mesmo é só este pedaço? E o que vai dar para fazer aqui?”, perguntou Gaspar.


"Dá para fazer dois quartos. Um banheiro. Uma varandinha. Vou subir um telhado. Vou fazer uma cobertura. Vai ser uma área de tanque e uma churrasqueirinha do lado. Um fogão a lenha, que é o sonho da minha esposa. Aí ela vai ficar mais ou menos realizada”, contou Lusivaldo.


"Adoro fogão a lenha”, completou a mulher do Lusivaldo.



“O que mudou de uns tempos para cá?”, questionou o repórter.



"Ganhei a laje. Que o meu sonho era ganhar a laje. Ganhei uma cama. Ganhei a televisão de plasma que chegou. Dou muito valor a ele”, respondeu a mulher de Lusivaldo.



Dacilene e Diana também parecem satisfeitas com o que têm conquistado.



“Dá para sentir isso na vida de vocês? Vocês sentem que o padrão melhorou? Que vocês têm uma vida um pouco mais confortável?”, questionou o repórter.



"Dá para sentir bem melhor do que antigamente”, disse Diana.


A casa própria virá, sem pressa. E com um detalhe: desenhada por quem já é carpinteira, mas quer seguir adiante, fazer curso de edificações.


"Eu mesma vou fazer a planta. Eu mesma vou fazer tudo”, afirmou Dacilene.



Lá foi ela, numa ensolarada manhã de sábado, no meio desta fila imensa. Gente procurando emprego na construção civil. Dacilene levou uma amiga interessada em seguir os passos dela no canteiro de obras.



"Devagarzinho nós vamos chegando lá”, completou Dacilene.



E quem duvida da Dacilene, do Lusivaldo e desta fila gigante de brasileiros?


Fonte: G1, 03 de setembro de 2012

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