Visões dos presidenciáveis foram medidas a partir de seus programas de governo

Pedro Fernando Nery
SÃO PAULO

Qual candidato tem o plano mais liberal? E o menos? Quais as semelhanças e diferenças entre os 13 candidatos à Presidência? Quem é mais parecido com quem? Quem está em polos opostos? E quem está no centro? No que eles divergem?

Aplicamos um “método de escala multidimensional” para os 13 planos registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral): eles são posicionados em um espaço de dois eixos conforme as similaridades, a partir dos posicionamentos em mais de 30 temas econômicos.

Assim, quanto mais distante o ponto do candidato A do candidato B, menos posicionamentos iguais possuem. A principal divisão dos pontos, que tem nos extremos João Goulart Filho (PPL) e João Amoêdo (Novo), se dá em um espectro do menos liberal para o mais liberal —na horizontal. Simplificadamente, esquerda-direita na economia.

O algoritmo usado aqui é comum em estudos do Legislativo. De acordo com uma série de votações, parlamentares são posicionados no mapa de acordo com seus votos, em pontos chamados de “pontos ideológicos”. Tipicamente o eixo horizontal se divide entre esquerda-direita.

Portanto, o resultado que apresentamos aqui é similar a tratar os 13 candidatos como participantes de mais de 30 votações do tipo “a favor” e “contra”.

Na imagem, os dois pontos mais distantes são os de João Amoêdo e Guilherme Boulos (PSOL). O programa de Amoêdo fala de ajuste fiscal, carga tributária menor e excessos nos salários dos servidores.

O de Boulos fala em investimento público, mexida no câmbio e emprego garantido pela União (e até relativiza a propriedade privada).

Os dois pontos mais próximos são os de Geraldo Alckmin (PSDB) e Henrique Meirelles (MDB). É uma distância dez vezes menor que a de Amoêdo e Boulos. Além das semelhanças nas propostas de reformas, eles se destacam por programas mais enxutos e menos detalhados. Como a resposta para as perguntas é binária, ao se omitir sobre uma ideia o candidato é considerado contrário a ela.

Programas enxutos merecem uma ressalva adicional. Uma campanha pode, para se proteger de ataques, não mencionar formalmente uma proposta no plano de governo.

Por isso, usar os planos de governo para criar o mapa desta página provocaria alguma perda de fidedignidade em relação ao que realmente pretendem os candidatos.

É o caso de Ciro Gomes (PDT) e a recriação da CPMF, e de Geraldo Alckmin e a maior liberdade no uso do FGTS: as duas propostas são conhecidas das candidaturas, mas não integram oficialmente o plano de governo.

O mapa, no entanto, acaba captando indiretamente esta postura. Ao fugir de determinados temas, campanhas mais seguras fogem dos extremos do mapa, onde estão, por exemplo, o PSOL à esquerda e o Novo à direita.

Algumas candidaturas consideradas de esquerda aparecem no campo liberal: Marina e Ciro se distanciam de Lula e Boulos pelos posicionamentos claros a favor de responsabilidade fiscal e reforma da Previdência (incluindo capitalização). Falam de flexibilização da legislação trabalhista, não falam de valorização real do salário mínimo.

O programa no meio do caminho é o de Alvaro Dias (Pode): sua coordenada no espectro liberal é o ponto mediano. Suas ideias seriam um meio-termo entre os seis candidatos à sua esquerda e os seis candidatos à sua direita.

E o que significa o eixo vertical? Por que alguns programas estão mais acima e outros estão mais abaixo?

Do lado esquerdo do mapa, candidaturas mais acima (Daciolo, Eymael, Vera) se separam das mais abaixo (Boulos, Lula). Do lado direito, mais liberal, os pontos de Ciro e Marina estão mais abaixo dos de Meirelles, Bolsonaro, Amoêdo. Desta vez, o mediano é Alckmin (o mais central no eixo vertical).

Essa divisão é menos clara, mas se relaciona com medidas relativas à desigualdade —como reforma tributária progressiva e Bolsa Família.

Ciro e Marina, por exemplo, são explícitos nos programas sobre formas de tributar os mais ricos, assim como Lula e Boulos. No campo mais liberal, isso não existe nos projetos de Amoêdo, Bolsonaro ou Meirelles. No menos liberal, não existe nos planos do filho de João Goulart ou do PSTU.

De certa forma, no campo da esquerda, a divisão cima-baixo reflete graus diferentes de sofisticação.

Os programas mais abaixo tratam de temas mais complexos, como tributação de lucros e dividendos, redução do spread bancário e mandato dual para o Banco Central (inflação e emprego). 

Já o grupo de Cabo Daciolo, Vera Lúcia e Eymael tem planos mais rudimentares: ainda sugerem, por exemplo, intervenções arbitrárias na dívida pública.

Por ali se misturam candidatos claramente de esquerda (como a do PSTU e o filho de João Goulart) com religiosos (“um democrata-cristão” e um pastor evangélico).

É evidente que todas as diferenças entre os candidatos não podem se reduzir a duas dimensões. Afinal, trata-se de um mapa, assumidamente uma representação visual que simplifica a realidade.

Por exemplo, Amoêdo e Bolsonaro, os mais liberais, possuem poucas discordâncias nos programas e que não são simples de classificar.

Amôedo é a favor de liberdade no uso do FGTS, Bolsonaro defende uma renda mínima universal. O primeiro é a favor da desvinculação do salário mínimo na Previdência, o segundo é explícito sobre sua capitalização.

Apesar disso, o mapa reproduz corretamente 94% dos posicionamentos dos candidatos. Isto é, se fôssemos usá-lo para reproduzir todas as votações fictícias para cada assunto (por exemplo: abertura comercial ou política industrial), somente 6% dos votos estariam errados.

Portanto, o espectro menos liberal a mais liberal captura bem as diferenças nos programas econômicos dos candidatos. Ao contrário do senso comum, não são todos “farinha do mesmo saco”.

Fonte: Folha de S.Paulo, 4 de setembro de 2018.