Os dados são da pesquisa "Nós e as desigualdades", encomendada pela ONG Oxfam Brasil ao Datafolha. O instituto ouviu 2.025 brasileiros de todo o Brasil, entre 10 e 14 agosto de 2017. A margem de erro para a amostragem geral é de 2% para mais ou para menos, considerando um nível de confiança de 95%. 

O levantamento demonstra que existe um amplo apoio da sociedade à ideia de que os governos têm a obrigação de trabalhar para diminuir as diferenças entre ricos e pobres. E não só: 82% dos brasileiros acreditam que os governos devem ter como prioridade diminuir a desigualdade regional e outros 82% creem que o governo deve transferir dinheiro público para que os Estados possam oferecer serviços públicos de qualidade. 

O estudo também aponta que, ao contrário do que quer a Fiesp e seus patinhos de borracha na cruzada contra a ampliação da carga tributária, os brasileiros não são avessos a qualquer alta de impostos. 

Segundo a pesquisa, apesar de 75% dos brasileiros se colocarem contra o aumento geral de tributos, o expressivo número de 71% dos entrevistados apoia o aumento de impostos para pessoas muito ricas, como forma de ampliar o financiamento público em áreas como educação, saúde e moradia. A Oxfam Brasil considera “muito ricos” aqueles pertencentes ao 0,1% da população, com ganhos a partir de 80 salários mínimos mensais.

Também para 71% dos ouvidos na pesquisa, quanto mais rica a pessoa, mais deve ser a proporção do imposto pago. Além disso, 72% avaliam que o governo deveria diminuir os impostos sobre os produtos e serviços que a população consome e compensar a diferença com aumento de impostos sobre a renda dos mais ricos.

A pesquisa descontrói, portanto, a ideia de que o brasileiro é anti-impostos “por princípio”. Os dados mostram que uma reforma tributária que promova maior justiça fiscal teria o apoio da população. 


Hoje, grande parte da estrutura tributária do país está baseada em impostos indiretos, ou seja, que incidem sobre o consumo de bens e serviços e não sobre a renda e a propriedade. Isso significa que, proporcionalmente, os mais pobres pagam mais impostos, já que possuem renda inferior, mas pagam o mesmo preço que os ricos por produtos e serviços. 

Além do mais, toda a renda da população mais pobre é utilizada no consumo, enquanto uma parte importante da renda dos mais ricos acaba convertendo-se em riqueza e patrimônio, cuja tributação é menor. 

De acordo com a Oxfam, o grupo que compõe o 0,1% da população brasileira tem 66% de isenção de impostos. Já a classe média - que recebe entre três e 20 salários mínimos -, tem apenas 17% de isenção, em média.

No seu relatório “A distância que nos une”, lançado em setembro, a ONG ressalta que a injustiça tributária tem reforçado a desigualdade no Brasil. O documento revelou que 5% da população tem a mesma fatia da renda nacional que os demais 95% e que apenas seis bilionários possuem riqueza equivalente ao patrimônio dos 50% mais pobre da população.

                 

Estado em alta; meritocracia em baixa

O Datafolha também mostra que a opinião popular vai na direção oposta daquilo que o atual governo defende no discurso e na prática. Para a maioria dos brasileiros, as soluções para reduzir as desigualdades passam, sim, pela atuação do Estado. Portanto, é preciso mais ação governamental e, não, menos, como propõe e faz a gestão Temer. 

Dentre as saídas oferecidas no questionário do levantamento para reduzir a distância entre rico e pobres, a maioria defendeu a oferta de empregos (71%), investimentos públicos em educação (67%) e a reforma do sistema político (61%). Em seguida, veio o aumento no investimento público em saúde (55%), redistribuição da carga tributária (25%) e expansão da assistência social (16%). 

A pesquisa também perguntou aos entrevistados se, no Brasil, uma pessoa de família pobre e que trabalha muito tem a mesma chance de ter uma vida bem-sucedida que uma pessoa nascida rica e que também trabalha muito. A tese da meritocracia foi rechaçada, em algum grau, por 60% dos respondentes. Outros 55% não acredita que crianças pobres com estudo têm oportunidades iguais àquelas de crianças ricas.

A maioria dos brasileiros não acredita, portanto, no “esforço pessoal” como saída única para a redução de desigualdades, o que reforça a importância do papel do Estado.

                        

Falta de horizonte e pessimismo com medidas de Temer

Apesar de avanços recentes no que diz respeito à redução de desigualdades de renda do trabalho especialmente nos governos petistas, ainda existe uma sensação geral de que a desigualdade entre ricos e pobres não diminuiu: 58% da população consultada acredita que nada ou pouco mudou.

O futuro também não parece melhor, para a grande maioria da população brasileira. Segundo a pesquisa, 66% não se diz esperançosa de que a diferença entre ricos e pobres irá diminuir, contra 31% de otimistas que acreditam em alguma melhora.

A baixa aprovação do governo Michel Temer também pode ser medida em uma das questões da pesquisa. Do total de entrevistados, 88% acreditam que a distância entre ricos e pobres não deve se alterar ou que irá aumentar ainda mais com as atuais medidas tomadas pelo governo federal. 

                         

Os ricos são os outros

O Datafolha expôs uma forte identificação de desigualdades com renda. Para 39% dos respondentes, desigualdade está relacionada a diferenças de classe social e má distribuição da renda; para 8%, com carência de recursos e serviços; e, para 7%, com diferenças na ação do governo e da classe política.

Do total da amostra, 91% das pessoas percebem que “poucas pessoas ganham muito dinheiro enquanto muitos ganham pouco”.

Além disso, as pessoas não se percebem na localização correta da escala de renda, se colocando como mais pobres do que realmente são no conjunto da sociedade. “Para a população de alta renda, os ricos são os outros”, diz o estudo da Oxfam Brasil.

“As pessoas têm a impressão de que estão numa situação difícil, quando na verdade há camadas muito mais pobres do que ela”, explica Katia Maia, diretora-executiva da ONG no Brasil. Para ela, quando a sociedade não consegue se localizar na pirâmide social, a luta contra a desigualdade perde a força.

                

Sugestões

No final do documento em que divulgou a pesquisa, a Oxfam aponta uma série de sugestões. Uma vez que os brasileiros se mostram dispostos a apoiar mudanças no sistema tributário que impliquem seu aumento de progressividade, a ONG defende a diminuição da incidência de tributos indiretos; o aumento dos tributos diretos; aumento do peso da tributação sobre patrimônio na arrecadação total; aumento da progressividade do IRPF para as camadas de rendas mais altas, criando faixas e respectivas alíquotas; eliminação dos juros sobre capital próprio; fim da isenção sobre lucros e dividendos distribuídos; avanço no combate a mecanismos de evasão e elisão fiscal e fim de paraísos fiscais.

Ao contrário da política de corte de gastos, a entidade pleiteia orçamentos públicos das três esferas – federal, estadual e municipal – com recursos adequados para políticas sociais, e que governos os executem; expansão de gastos públicos em educação, saúde, assistência social, saneamento, habitação e transporte público; revisão do teto de gastos imposto pela Emenda Constitucional 95 e medidas que melhorem a qualidade do gasto público, tornando-o mais transparente, mais eficiente, mais progressivo e com efetiva participação social.

Para ver a pesquisa completa e outras propostas da Oxfam, clique aqui.

                          

Fonte: Vermelho , 07 de dezembro de 2017