REFLEXÕES TRABALHISTAS

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A função do julgador e operador do Direito não se resume a simples operação lógico-formal, porquanto, estes não são, como outrora, considerados meros "escravos da lei", vinculados aos seus estritos termos, na busca da descoberta da vontade do legislador.

A tarefa do operador contemporâneo do Direito é, primeiramente, descobrir a verdadeira razão social da lei, para, na avaliação dos interesses em conflito, encontrar a solução legal, porém, ideal e mais justa. Isso, no entanto, pode variar de caso para caso, eis que, sabidamente, sendo o Direito uma ciência social variável nas suas vicissitudes, o resultado da sua aplicação sempre receberá um pouco de influência da personalidade e ideologia do seu operador.

Mas para que não seja tão subjetiva a sua análise valorativa, é preciso, antes da aplicação da lei, refletir-se sobre a verdadeira finalidade do ramo em que se está atuando, pois, por exemplo, diferentes são os enfoques hermenêuticos do Direito Civil, do Direito Penal e do Direito do Trabalho, este, social por natureza.

Portanto, para interpretar e aplicar o Direito do Trabalho é preciso procurar e determinar os seus objetivos e fins, para, depois, tratar dos métodos e regras específicas de interpretação laboral.

O Direito do Trabalho é composto de regras que atingem os direitos sociais e fundamentais dos trabalhadores, pelo que, para aplicá-las, antes, cabe fazer a interpretação de cada dispositivo legal à luz do texto constitucional, para se buscar o seu sentido e alcance. É necessário fazer um trabalho interpretativo científico e não meramente embasado em interesses econômicos, políticos e outros.

Toda lei, antes de ser aplicada, precisa ser interpretada, por mais clara que seja. Essa tarefa em relação ao Direito do Trabalho começa com a opinião dos doutrinadores. Na prática, serão os advogados, como primeiros "juízes" das causas, que levam ao Judiciário trabalhista o seu entendimento sobre determinada situação jurídica e, finalmente e em especial, aos juízes do trabalho caberá dar a palavra final, o que deve ser feito sempre em conformidade com o texto da Carta Maior brasileira. Isso porque o primeiro cuidado do intérprete de uma lei é verificar se ela se conforma com a Constituição Federal, no seu conteúdo.

Como farol para essa importante tarefa assegura o artigo 1º da Constituição Federal que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. O artigo 3º, por sua vez, consagra que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais. Já o artigo 170, que trata da ordem econômica no Brasil, ou seja, do sistema capitalista, preconiza com ênfase que a ordem econômica funda-se em primeiro lugar na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados, entre outros, os princípios da busca do pleno emprego e da defesa do meio ambiente.

No ponto central do papel do Direito do Trabalho, o artigo 7º da Constituição Federal estabelece que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, todos aqueles inseridos nos seus incisos. São os chamados direitos mínimos, estando incluídos neles o piso vital mínimo ou "patamar civilizatório", como denomina Maurício Godinho Delgado (Curso de Direito do Trabalho, São Paulo, LTR, 2005, pág. 117).

Esse piso vital mínimo de direitos visa garantir e implementar a proteção à dignidade da pessoa humana, não se podendo perder de vista a valorização do princípio protetor do Direito do Trabalho, que é a sua razão de ser, como medida de efetividade dos direitos fundamentais da pessoa humana e da realização do princípio do valor social do trabalho.

É certo que se vive um "novo" Direito do Trabalho, rumo à indústria 4.0, mas os operadores desse ramo do Direito não podem, não obstante isso, descurar-se da finalidade social e humanitária do Direito Laboral.

 é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP, professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre eles, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2022-nov-25/reflexoes-trabalhistas-interpretacao-aplicacao-direito-trabalho-contemporaneo