Por Anaïs Fernandes, Valor — São Paulo

Na primeira revisão de cenário publicada em 2022, o Santander atualizou sua projeção de crescimento do PIB brasileiro em 2021 de 4,7% para 4,6%, mantendo a expectativa de 0,7% em 2022.

Após a divulgação dos dados do PIB do terceiro trimestre de 2021 e de índices de atividade mais tempestivos, o Santander passou a prever que o crescimento da economia no quarto trimestre do ano passado foi de 0,2%, frente aos três meses imediatamente anteriores, e não mais de 0,4%.

Para o PIB de 2022, apesar de ter mantido sua previsão, o banco elevou a estimativa de crescimento do primeiro trimestre de 0,4% para 0,7%, “refletindo a melhora nas expectativas para as principais safras em 2022 e os maiores níveis de mobilidade urbana”, escrevem a economista-chefe do Santander Brasil, Ana Paula Vescovi, e sua equipe.

Eles ponderam, no entanto, que estão monitorando os efeitos da seca na região Sul do Brasil, assim como a onda de contágio da variante ômicron, que, dizem, configuram riscos baixistas relevantes para as projeções.

Do lado da inflação, o Santander fez ajustes de curto prazo que levaram a uma revisão para cima na projeção do IPCA 2022, de 5,8% para 6%. A projeção para 2023 foi mantida em 3,5%. A mudança para este ano, diz o banco, resulta de surpresas nas leituras recentes e de mudanças em hipóteses específicas para reajustes de preços administrados - licenciamento de automóveis, em particular.

“Continuamos a enxergar um processo desinflacionário lento e arriscado, em meio a dificuldades no processo de re-ancoragem (e resultantes riscos de uma maior inércia). Antecipamos uma composição mais desfavorável para a inflação este ano, com itens mais ligados aos núcleos de inflação ainda acelerando, e itens mais voláteis (em teoria, menos importantes para a política monetária) perdendo força”, afirmam.

O Santander manteve sua projeção de uma Selic encerrando o ciclo de aperto neste ano em 12,25%, com altas de 1,5 ponto percentual em fevereiro e março. "O tom hawkish (contracionista) da autoridade enfatiza o viés altista no balanço de riscos para a inflação, em meio a um risco de desancoragem, em função de desdobramentos fiscais", diz o relatório.

Para o banco, só haveria espaço para iniciar um processo de redução da Selic - em direção ao nível neutro de 7%, em algum momento - em 2023, "caso as incertezas de política econômica arrefeçam", ponderam.

No câmbio, o amplo intervalo no qual a taxa flutuou no início de 2022, diz o Santander, reforça a visão de que a moeda deverá seguir trajetória volátil neste ano. A avaliação é que o real irá se desvalorizar ao longo de 2022, já que as incertezas quanto à trajetória de longo prazo da dívida pública e às decisões de política econômica para tratar da questão fiscal deverão permanecer elevadas.

A expectativa do banco é de uma cotação de R$ 5,70 por dólar em dezembro de 2022 e de R$ 5,20 no fim de 2023, "assumindo sinais positivos no quarto trimestre de 2022 sobre um provável retorno de negociações para reformas macroeconômicas no ano seguinte", observa.

No âmbito fiscal, o Santander estima agora um saldo primário positivo para o setor público em 2021 - de 0,4% do PIB, ante déficit de 0,1% na última projeção -, impulsionado por um forte resultado de governos regionais (ligeiramente acima de 1% do PIB).

Para 2022, a projeção mudou de um déficit de 1,7% do PIB para 1%, na esteira do maior efeito da inflação nas receitas, com uma estimativa de deflator do PIB dois pontos percentuais mais alta, em 8,7%, o que eleva tanto o PIB nominal quanto a arrecadação. Além disso, pesaram também melhores perspectivas de resultados dos governos regionais (com superávit de R$ 20 bilhões, ante R$ 5 bilhões) e menores estimativas de gastos (R$ 25 bilhões a menos), assumindo uma menor execução de precatórios e maior empoçamento, isto é, restos a pagar.

Como resultado, o Santander vê agora o pico da dívida atingindo 98% do PIB em 2030 (cinco pontos percentuais abaixo do cenário anterior), devido aos efeitos do nível de PIB nominal mais alto e à revisão da trajetória de primário.

"Apesar dessa melhora nas estimativas, continuamos vendo um caminho arriscado para a consolidação fiscal. A decisão de aumentar os gastos e alterar o arcabouço fiscal (via PEC dos Precatórios) implica em um cenário mais desafiador para a estabilização da dívida à frente, com necessidade de mais reformas estruturais e uma âncora fiscal robusta", diz a equipe.

Conta corrente e cenário externo

A projeção de déficit em transações correntes de 2021 foi ampliada de US$ 19,3 bilhões para US$ 28,2 bilhões, em virtude da revisão na série de dados conduzida pelo BC e por saldos comerciais aquém do esperado, devido a problemas na cadeia doméstica de suprimentos que impulsionaram as importações.

“Entretanto, seguimos projetando recuo do déficit em 2022 para US$ 20,6 bilhões (antes: US$ 11,6 bilhões) em resposta ao lento crescimento da demanda doméstica, à moeda fraca e à perda de fôlego nos preços das commodities.”

No cenário internacional, o Santander alterou suas projeções para a política monetária americana, incorporando uma alta de juros de 0,25 ponto percentual já em março, com três altas adicionais em 2022 e outras quatro elevações de mesma magnitude em 2023.

“Entendemos que os riscos vão na direção de um processo de aumento de juros ainda mais célere na maior economia do mundo, caso a inflação se mostre mais persistente em níveis elevados”, afirmam.