Por Lucianne Carneiro e Alessandra Saraiva, Valor — Rio

Enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) como um todo avançou 1% no primeiro trimestre de 2021, frente ao primeiro trimestre de 2020 – a primeira taxa positiva após queda seguida na comparação anual -, o consumo das famílias recuou 1,7% na mesma base de comparação.

O movimento foi influenciado pelo contexto da pandemia, pela inflação mais pressionada, a suspensão do auxílio emergencial e o mercado de trabalho enfraquecido, afirma a coordenadora de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), Rebeca Palis.

Na comparação com o quarto trimestre de 2020, o consumo das famílias teve variação de -0,1%, o que foi classificado como estabilidade pelo IBGE.

“São várias coisas que afetam o consumo das famílias ao mesmo tempo. Tem os efeitos negativos do mercado de trabalho, a ausência dos programas de apoio do governo e a inflação. Na hora que a inflação aumenta, muito ligada aos alimentos e bebidas, isso afeta o consumo das famílias, especialmente as de mais baixa renda”, explica.

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 5,3% no primeiro trimestre de 2021, ante variação de 3,8% em igual período do ano passado.

Considerando a passagem entre o quarto trimestre de 2020 e o primeiro trimestre de 2021, Rebeca Palis afirma que não é possível saber o que mais pesou no comportamento do consumo das famílias: se foi o aumento das medidas de restrição ao deslocamento de pessoas ou a ausência dos programas de apoio ao governo.

“Em relação ao trimestre anterior, teve piora da pandemia, com a segunda onda. Então tem algum efeito de mobilidade, esse efeito negativo da inflação e também da falta dos recursos do governo. Não dá para saber o que pesou mais”, diz.

Empreendimentos residenciais

O Produto Interno Bruto (PIB) da construção mostrou quadro menos desfavorável no primeiro trimestre de 2021, admitiu Palis. O desempenho do setor consta das Contas Nacionais referentes ao primeiro trimestre, anunciadas hoje pelo instituto.

Nos primeiros três meses do ano, ainda houve recuo de 0,9% no PIB da construção ante primeiro trimestre de 2020; mas com alta de 2,1% ante quarto trimestre de 2020. A queda de 0,9% foi o recuo mais fraco desde início de 2020; e a melhor taxa, nessa comparação, desde o terceiro trimestre de 2019 (4,3%). No quarto trimestre de 2019, essa taxa ficou estável, mostrando quedas sucessivas em diante. Já o aumento de 2,1% é o melhor desempenho desde terceiro trimestre de 2020 (6,5%).

Rebeca notou que o recuo de 0,9% ainda é influenciado por crescimento de 15,4% nos insumos típicos para o setor, ante mesmo período em 2020. Além disso, ela admitiu que, no mesmo período de comparação, houve queda de 5,6% na ocupação do mercado de trabalho do setor.

No entanto, observou que o quadro é menos ruim, no setor, do que em períodos anteriores. A técnica comentou que movimentos menos desfavoráveis em empreendimentos residenciais podem ter contribuído positivamente para o resultado. "As obras de infraestrutura que são na maioria feitas por setor público ainda estão fracas" disse, observando que isso reflete ações de restrição orçamentária delineadas pelo atual governo.

Pandemia muda pesos

Os efeitos da pandemia por covid-19, iniciada em março do ano passado, têm ajudado a mudar os pesos das atividades econômicas dentro do PIB, observou a chefe do Departamento de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rebeca Palis. O instituto divulgou hoje o resultado das Contas Nacionais, referentes ao primeiro trimestre deste ano.

Ao falar sobre o comportamento do PIB do primeiro trimestre, anunciado hoje, a técnica ressaltou a boa performance do setor agropecuário, no começo do ano. O PIB do setor subiu 5,7% no primeiro trimestre de 2021 ante quarto trimestre de 2020. Na comparação com o primeiro trimestre de 2021, a alta foi de 5,2%. A possibilidade de safra recorde de soja, esse ano, ajudou a contribuir positivamente o resultado do setor, informou ela.

As boas taxas em agropecuária já eram observadas no ano passado. "Vejo que, no ano passado, a participação do agropecuária no PIB foi de 6,8% em 2020. E era de 5,1% em 2019. Um salto de mais de um ponto percentual. É muita coisa para um ano" afirmou.

A técnica notou que a agropecuária foi um dos setores, da economia, menos afetados pela pandemia. Isso fez com que "pegasse" espaço da atividade de serviços, no ano passado - setor mais prejudicado pelo avanço da covid-19 no país, devido à forte presença de negócios notadamente presenciais, nessa atividade, como turismo, por exemplo.

O tópico "Outras Atividades de Serviços", que representam serviços prestados às famílias e mais presenciais, teve recuo de participação no PIB de 18% para 16,2% entre 2019 e 2020 segundo Rebeca. "Serviços como um todo entre 2019 e 2020 diminuiu de 73,5% para 72,8% [participação no PIB]. Caiu um pouco, mas ainda é o setor de maior peso na economia [pelo lado da oferta]", observou.

Ao ser questionada se o peso de agropecuária pode continuar a subir, esse ano, e "pegando" espaço de serviços no cálculo da economia como um todo, devido à continuidade da pandemia em 2021, a especialista foi cautelosa. Ela contou que ainda não está visível o impacto, na atividade de serviços, de menor cadência de restrições de circulação social - delineadas para diminuir contágio por covid-19 -, esse ano ante ano passado. Ou seja, não dá para saber se a atividade de serviços continuará, em 2021, com o mesmo ritmo fraco do ano passado.