Quem conhece seu Alfredo Dente já sabia que ele não iria desistir e deixar um direito para trás. Não foi diferente quando o aposentado ficou sabendo, em meados de 2018, que tinha um dinheiro depositado em seu Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), mas que não poderia sacá-lo por causa de um erro cometido há mais de cinco décadas por quem fez o depósito.

Provando a fama de persistente, desde então o morador do município de Sorriso percorreu diversos órgãos e entidades, a começar pelo próprio banco, depois a Justiça Federal e, por fim, bateu às portas da Justiça do Trabalho, onde ajuizou três ações até conseguir o resultado que buscava.

Direito

Tudo começou há 52 anos, coincidentemente, no mesmo mês em que o FGTS passou a existir. Instituído pela Lei 5.107, de setembro de 1966, esse direito criado para proteger o empregado dispensado sem justa causa entrou em vigor em 1º de janeiro de 1967. Exatamente nessa data, o jovem trabalhador Alfredo teve sua conta aberta para receber os depósitos do novo benefício. Na época, ele trabalhava “puxando” material de construção, como ele se refere à atividade de entregador, para um condomínio em Salvador, na capital baiana. O serviço prosseguiu por quatro meses e os depósitos bancários, também.

A vida seguiu e o dinheiro ficou guardado todos esses anos, sem que o trabalhador soubesse de sua existência. Mas isso mudou quando o Governo Federal anunciou, há cerca de dois anos, a liberação de saques de contas ativas e inativas do FGTS como forma de fomentar a economia.  Seu Alfredo estava entre os primeiros da fila da agência da Caixa Econômica Federal de sua cidade para conferir se a novidade se aplicava a ele, relembra a advogada Juliane Julião, que o acompanhou na empreitada que se seguiu.

Inconsistência

A informação de que havia saldo foi acompanhada, no entanto, da má notícia: devido a uma inconsistência entre o titular da conta e o número do PIS não seria possível fazer o saque. Na busca de solucionar o problema, seu Alfredo deu início a uma peregrinação, que incluiu até mesmo a uma audiência informal com um magistrado da Justiça Federal.

Mas as diversas negativas não o desanimaram. “Trata-se de um cidadão peculiar, conhecido por ir atrás dos seus direitos”, explica a advogada.

Ação judicial

Após frustrados os esforços pelas vias administrativas, foi ajuizada uma ação judicial na Vara do Trabalho de Sorriso, acionando o síndico do imóvel à época da prestação do serviço. A tentativa, no entanto, não prosperou já que, logo no início da tramitação do processo, descobriu-se que ele já havia falecido. A segunda também foi extinta.

O terceiro processo foi iniciado há um ano, desta vez tendo como parte o condomínio, devidamente notificado e intimado do trâmite processual.  Ao final, a tenacidade deu resultado: em setembro do ano passado, mês em que completou 77 anos de idade, seu Alfredo teve publicada a decisão definitiva de seu caso.

Proferida pelo juiz Diego Cemin, a sentença determinou a correção do equívoco nos dados referentes à conta do trabalhador aposentado, com base, entre outras provas, nos registros no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) e informações da própria CEF.

No dia seguinte à publicação da decisão, seu Alfredo compareceu pessoalmente à Vara do Trabalho e pegou o alvará judicial com a autorização para o saque. 

O montante a que teve direito foi de aproximadamente 800 reais. “Como se vê, não é questão do valor, o que importava para ele era a concretização de um direito que, quem o conhece, sabe que ele não deixaria para trás”, conclui a advogada.

Direito garantido, saque comprovado nos autos, o processo foi arquivado no último dia 30 de janeiro.

Fonte: TRT da 23ª Região (MT)