Com teto de gastos, Previdência e pessoal pressionam despesas e forçam cortes no orçamento.

BRASÍLIA

A quatro meses do fim do mandato, Michel Temer enviou nesta sexta-feira (31) ao Congresso o Orçamento de 2019 com um rombo de R$ 258 bilhões em despesas previstas que, para serem pagas pelo próximo presidente, precisarão de aprovação do Congresso.

Caso contrário, o novo governo dará seus primeiros passos infringindo a chamada regra de ouro, que proíbe que se endivide para pagar despesas correntes.

Sem receitas suficientes para bancar essas despesas, o governo teve de incluir no Orçamento a previsão de crédito suplementar, uma situação prevista na Constituição.

Só com o aval do Congresso será possível tomar novos empréstimos e honrar com o pagamento de benefícios previdenciários, assistenciais, programas de subsídios e até o Bolsa Família.

Dos R$ 637,8 bilhões previstos para os benefícios do RGPS (Regime Geral de Previdência Social), será preciso aval dos parlamentares para R$ 202,2 bilhões.

Metade dos valores a serem destinados ao pagamento do BPC (Benefício de Prestação Continuada) e do Bolsa Família também estará nas mãos dos congressistas --R$ 30 bilhões e R$ 15 bilhões, respectivamente.

Temer, que tomou posse prometendo reformas e a redução do gasto, entrega o Orçamento com uma projeção de expansão das despesas primárias da União --que passaram de 91% do PIB (Produto Interno Bruto), em 2016, e podem chegar a 93%, em 2019.

Segundo o Ministério do Planejamento, caso a economia continue patinando, a massa salarial sofrerá uma retração de quase um ponto percentual, passando de 8,44% para 7,54%, em 2019.

Esse quadro foi apresentado pelos ministros do Planejamento, Esteves Colnago, e da Fazenda, Eduardo Guardia, nesta sexta-feira (31), limite previsto para o envio da proposta orçamentária.

Essa situação reflete os impactos da reforma da Previdência e do funcionalismo público que não passaram pelo Congresso.

Os parlamentares não quiseram assumir o desgaste político dessas reformas em período de eleição.

​O resultado é que, somente em 2019, a projeção de despesas com Previdência e folha de pagamento aumentou em R$ 67,6 bilhões --o que representa um crescimento de um ponto percentual em relação ao total de gastos primários de 2018.

"O governo caminha para ser um gestor de Previdência e folha de pagamento. Isso é muito pouco para o governo", disse Colnago.

Temer passa o bastão das contas públicas com despesas equivalentes a R$ 2 trilhões, quase um terço do PIB. Desse total, aposentadorias e salários respondem por 45%.

Como essas despesas são obrigatórias, levam a cortes em despesas de custeio da administração --como água, luz, telefone, transporte dos órgãos públicos federais-- e do investimento.

Segundo os ministros, essa margem de manobra está ficando cada vez menor. Em 2019, elas serão reduzidas em R$ 10,6 bilhões, ficando em patamar equivalente ao registrado uma década antes.

Nesse ritmo, projeções do Ministério do Planejamento indicam que a administração pública federal deve parar em 2021, caso as reformas não sejam feitas.

Por isso, a saída do governo vem sendo cortar investimentos, como obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Em 2019, só haverá R$ 27,4 bilhões para investimentos. Em 2018, o investimento deve fechar em R$ 31,1 bilhões. Em 2017, foram R$ 33,1 bilhões. É o índice mais baixos da última década. Investimento gera emprego.

Para Colnago, o resultado não é tão ruim se considerarmos que o aumento de capital de empresas estatais e eventuais emendas parlamentares também são investimentos.

Sob pressão ao conceder reajuste de 16,38% para o Judiciário federal, o governo decidiu manter o adiamento do reajuste do funcionalismo --que permitirá um economia de R$ 4,7 bilhões no Orçamento.

Na quinta (30), Temer havia autorizado o reajuste dos servidores do Executivo, mas voltou atrás diante do quadro fiscal.

Como a elevação salarial está prevista em lei para 2019 o governo vai apostar novamente em uma medida provisória para o adiamento em 12 meses. A MP dependerá de aprovação do Congresso.

Em outubro de 2017, Temer já havia tentado medida semelhante para suspender reajustes de uma série de carreiras. A MP editada à época foi barrada por liminar do STF (Supremo Tribunal Federal).

Segundo os ministros, o aumento do Judiciário foi mantido porque o Executivo não pode interferir na decisão de outro Poder.

Para compensar, Temer decidiu conceder um aumento um pouco maior para o salário mínimo, que será de R$ 1.006 para 2019 --a proposta era de R$ 1.002 e fora aprovado pelo Congresso R$ 998. Atualmente, o salário é de R$ 954.

Não foi previsto para o próximo ano espaço orçamentário para reajuste da tabela do Imposto de Renda.

Em relação à realização de concursos públicos, ficam autorizados apenas aqueles já previstos. Haverá uma reserva de R$ 411 milhões para os casos em que o Executivo tiver de realizar um concurso emergencial ou por determinação da Justiça.

Mesmo diante do aperto, Guardia afirmou que as regras que travam o crescimento das despesas --teto e a regra de ouro-- serão mantidas.

No entanto, a maioria dos candidatos à Presidência criticam as barreiras.

"Abrir mão do teto de gastos é uma decisão extremamente arriscada para o país", disse Guardia ao ser questionado sobre a posição dos candidatos.

Bernardo Caram , Talita Fernandes e Julio Wiziack
Fonte: Folha de S.Paulo, 3 de setembro de 2018.