Estamos no rumo certo, mas reformas são cruciais

O momento de volatilidade que observamos nos mercados de câmbio e de juros poderia levar o leitor a acreditar que um artigo sobre temas de longo prazo esteja fora de hora, mas é exatamente durante as turbulências que precisamos ter mais clareza sobre a direção que seguimos e as transformações subjacentes a esse movimento para o país.

Estamos na direção de uma economia de juros baixos. O Brasil, finalmente, possui as condições para manutenção de juros em níveis compatíveis com seus pares internacionais. A Selic já está baixa para o padrão histórico brasileiro. É a menor taxa de todo o período do real. Os juros para os tomadores têm se reduzido também e serão ainda menores com a competição pelo crédito e a melhoria da eficiência das operações. 

Para a consolidação desse processo, o caminho tem sido o de controle das despesas públicas e da inflação, a recuperação das estatais, a implementação de políticas microeconômicas para melhorar a eficiência e a produtividade, tais como a reforma trabalhista, a terceirização, a abertura da exploração do pré-sal, a permissão de saques e o aumento da remuneração do FGTS.

Essas ações estão produzindo resultados e só reforçam que estamos no caminho certo. Temos que continuar perseguindo o equilíbrio das contas públicas, e a reforma da Previdência é o passo mais importante. Mas há uma série de outras reformas microeconômicas, como a tributária, por exemplo, voltadas para aumentar a competitividade. Medidas estas que são necessárias para sustentar o crescimento econômico na era dos juros baixos. 

A continuidade das reformas —aliada à retomada do investimento público— permitirá que o Brasil cresça em nível acima do potencial durante a próxima década. Estudo do BNDES demonstra que, mesmo crescendo entre 2% e 3% ao ano nos próximos cinco anos, o hiato do produto só se fecharia em 2023. 

Este crescimento será financiado pela liberação de enormes volumes financeiros que já existem. O sistema financeiro brasileiro possui atualmente R$ 9 trilhões em ativos. Os fundos de investimentos detêm quase R$ 4 trilhões, e os fundos de pensão, seguradoras e de capitalização possuem outros R$ 2 trilhões. 

A manutenção das taxas em níveis baixos e o vencimento de títulos antigos farão com que parte importante desse volume se movimente na economia, buscando rentabilidade. É o caso de grande parte dos mais de R$ 1 trilhão de ativos hoje investidos por "family office" (pessoas físicas ou famílias com patrimônio muito elevado). Este dinheiro estava parado, por anos, em instrumentos financeiros de curto prazo, com rentabilidade superior a 10% ao ano, impróprios para o financiamento do crescimento.

Com a queda dessa rentabilidade para menos de 5% ao ano, o dinheiro migrará para opções no mercado financeiro e no lado real da economia. Isso vai mudar o país. Boas empresas com bons projetos encontrarão financiamento mais facilmente porque vão oferecer mais rentabilidade por um prazo maior.

Precisamos, portanto, desenvolver ainda mais os mercados de longo prazo. E isso será possível com a manutenção da Selic ao redor de 6 %.

Na era dos juros baixos, a rentabilidade dos bancos será posta à prova. Para compensar a redução dos juros, as instituições buscarão aumentar o volume dos ativos e, naturalmente, farão uma ampliação da oferta de crédito, reduzindo os custos para o tomador final. 

O BNDES tem o desafio de sair da posição de quase monopolista no financiamento de longo prazo para a de desenvolvedor de novos produtos, de estruturador dos grandes projetos produtivos e de infraestrutura e de facilitador do crédito às micro e pequenas empresas. Nesse cenário, o BNDES será determinante para o crescimento econômico do país.

Dyogo Oliveira

Presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) desde abril; ex-ministro do Planejamento (2016-2018, governo Temer)

Fonte: Folha de S.Paulo, 31 de agosto de 2018.