Os senadores não podem aceitar um acordo que sugere o veto presidencial de dispositivos do projeto de reforma trabalhista se não é possível dizer que governo estará a postos quando a proposição, após aprovada no Congresso, chegar ao Planalto. Foi o que argumentaram os senadores da oposição em suas manifestações contrárias ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) 38/2017, durante a análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), nesta terça-feira (30).

- Não temos segurança sobre na mão de quem o governo estará depois do próximo dia 6 – disse Jorge Viana (PT-AC) ao recordar a sessão marcada para análise da proposta de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O relator da proposição na CAE, senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), propôs que o Senado aprove o projeto como veio da Câmara para que a matéria não tenha que retornar àquela Casa, mas com o compromisso de veto presidencial a itens que considera prejudiciais aos trabalhadores, como a possibilidade de gestantes e lactantes se submeterem a trabalho insalubre. Além disso, ele também recomenda que o Planalto vete o trecho sobre jornada intermitente e edite medida provisória regulamentando a matéria.

Nem mesmo o compromisso do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ao reafirmar a disposição do Executivo de vetar os pontos destacados por Ferraço foi suficiente para selar o acordo e permitir a votação do relatório sem conflitos.

- Esse acordo é indecoroso. Vossa Excelência, como relator, reconhece equívocos em vários pontos e em vez de corrigi-los pede para o governo vetar e editar uma medida provisória? Um governo que a gente sabe que não se sustenta mais 15 dias? É um escândalo. Em qualquer circunstância seria um escândalo, mas mais ainda nesta crise política. Não adianta tapar o sol com a peneira: esse governo pode cair. Faço um apelo ao senador Ricardo Ferraço para que volte atrás e modifique o relatório – afirmou Lindbergh Farias (PT-RJ).

Em sua defesa, Ferraço afirmou que só buscou entendimento e acordo para a votação da proposta, mas que não se furta de promover mudanças se a maioria dos parlamentares assim entender, o que levaria o texto a retornar para a Câmara.

Ele também contestou críticas feitas pelos senadores contrários à proposta, como a de que o texto dificultaria o acesso dos mais carentes à Justiça.

- Ouvi que estamos cerceando o acesso de pessoas pobres à Justiça. Isso é uma mentira. Esta garantia está na Constituição. Há uma garantia constitucional que não pode ser violada por uma legislação ordinária – disse.

Ferraço lembrou que o Brasil responde por 98% das ações trabalhistas no mundo, mas sustentou que não há flexibilização a este respeito no projeto sem proteção:

- Todas elas vêm acompanhados de proteção. Não há nenhum artigo que estejamos flexibilizando sem proteção. Bem regulamentada a jornada intermitente pode gerar 2 milhões de novos postos de trabalho. Bares, restaurantes e hotéis tem uma jornada diferente. Ou vamos olhar o mundo pelo para-brisa ou vamos continuar olhando pelo retrovisor.

O projeto será votado na CAE na próxima terça-feira (6).

   

Voto em separado

Paulo Paim (PT-RS) informou que dever ler, na próxima semana, voto em separado (relatório alternativo) ao projeto da reforma trabalhista. O senador disse não entender a pressa na aprovação da proposta e por que ela não pode voltar para a Câmara após ser debatida nas outras duas comissões previstas, Assuntos Sociais e Constituição, Justiça e Cidadania. Ele pediu que se garanta a passagem por todas as comissões, sem acelerar a tramitação.

Paim disse estar preocupado com os comentários de que, após a aprovação do projeto na CAE, seria apresentado um pedido de votação em regime de urgência, remetendo a matéria para o Plenário, sem passar pelas outras duas comissões, como previsto atualmente. Ele manifestou, no entanto, confiança em seus colegas, que garantiram que não haverá pedido de urgência.

- Estou convicto de que ninguém vai nos atropelar, não permitindo que as três comissões votem e depois se faça o debate no Plenário - disse Paim.

No entanto, Ferraço ponderou que os senadores devem decidir se o Senado vai adiante com o projeto ou se o modifica, fazendo com que ele volte para a Câmara, mas correndo o risco de ver todas as modificações sugeridas no Senado serem ignoradas.

- Se incluirmos as mudanças no relatório e o projeto voltar para a Câmara, como vamos garantir o aperfeiçoamento que estamos propondo no debate que fizemos aqui? Não gostaria de ver esses pontos destacados sendo derrotados na Câmara, porque os deputados já manifestaram sua opinião. Se isso volta para lá, vão passar a régua, e ao passar a régua, vai prevalecer a discussão final da Câmara – ponderou.

Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Lídice da Mata (PSB-BA) também apresentaram votos em separado, que serão lidos antes da votação do relatório de Ferraço.

   

e-Cidadania

Gleisi Hoffmann (PT-PR) citou números do e-Cidadania, canal que garante a participação popular nos temas discutidos no Senado, para registrar que 128 mil pessoas se manifestaram contra o projeto de reforma trabalhista nos atuais termos, e apenas cinco mil o apoiaram. Ela questionou os argumentos do governo e do relator de que a matéria é de interesse da sociedade e de que o Brasil tem pressa na votação das reformas, e frisou que o Senado, majoritariamente composto por integrantes oriundos de famílias ricas e empresariais, é quem vai decidir o destino do trabalhador pobre.

- Gostaria de saber que sociedade brasileira tem interesse nisso: a sociedade empresarial, as famílias ricas que não precisam de salário? – questionou.

Na mesma linha, Lindbergh lembrou que o texto só retira direitos de trabalhadores, e nenhuma medida de ajuste estaria recaindo sobre o “andar de cima”, onde estariam banqueiros, empresários e também a elite do funcionalismo. Na sua visão, o quadro é de “completo descolamento da realidade”.

- Agora, para o devedores da Previdência do setor rural estão organizando perdão de dívida de dez bilhões de reais. Por isso, a minha proposta é para a gente parar com esse projeto e discutir as distorções do sistema tributário – disse.

   

Favoráveis

Cristovam Buarque (PPS-DF) manifestou posição favorável ao relatório e à proposta de Ferraço. Disse que o Brasil tem pressa e lamentou que essa lei não tenha sido feita 15 anos atrás pois, em sua avaliação, há um descompasso entre a legislação e as mudanças nas relações trabalhistas. Para evitar que a proposição retorne à Câmara, Cristovam sugeriu que senadores apresentem suas emendas na forma de projetos de lei.

- Temos que colocar em uma lei trabalhista o direito a férias para descanso e licença para estudo, para reciclagem. Apresentei uma emenda nesse sentido, mas reconheço que a pressa que o Brasil tem justificou o relator não aceitar essa emenda. Vou apresentar um projeto de lei paralelo. Podemos fazer isso – disse.

Para Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) o projeto de reforma trabalhista deve ser aprovado, pois preserva os direitos fundamentais e alarga as regras do processo de diálogo entre as partes na relação de trabalho, o que vai proporcionar um crescimento do emprego no país.

- Eu quero aqui manifestar a minha convicção de que essa reforma trabalhista vem para combater graves problemas que afetam a produtividade da economia brasileira. A legislação brasileira está desconectada do mundo de empregos, sobretudo dos empregos mais qualificados, com a economia baseada em conhecimento e na globalização da informação - disse.

Ao final da discussão do relatório, o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN) fez um apelo à moderação e à civilidade durante os debates e se solidarizou com o relator, Ricardo Ferraço, que foi duramente criticado pela oposição por ter desistido de paralisar a análise do texto, como havia anunciado anteriormente, e por não ter feito modificações relevantes.

- Vamos respeitar a legitimidade do mandato dos outros. Eu não penso que estou votando contra o trabalhador. Temos que ter respeito ao contraditório – apelou Garibaldi.

   

Fonte: Agência Senado, 31 de maio de 2017