Retomada do crédito e melhora da macroeconomia ajudam setor

Mercado de imoveis Barra da Tijuca. Na foto o Condominio Ilha Pura - Foto 

                                      

Para o mercado imobiliário brasileiro, de forma geral, 2018 deve marcar a virada de chave. A melhora no cenário macroeconômico e a retomada no crédito para o setor — a Caixa reativou neste início de ano a linha Pró-Cotista, aumentou o limite para o financiamento de imóveis de 50% para 70% e vai receber R$ 15 bilhões em recursos para financiar a compra da casa própria — devem puxar a demanda. No Rio de Janeiro, contudo, o cenário ainda é de preços em baixa, estoques elevados — sobretudo em unidades para média e alta renda — e demanda frágil. Na melhor hipótese, o mercado carioca vai atravessar 2018 andando de lado, perseguindo a meta de chegar à estabilidade em vendas e preço.

- Os últimos quatro anos foram o inferno astral do mercado imobiliário do Rio. Desde 2013, as vendas recuaram 60%. No ano passado, a queda foi de 30% a 35%. Este ano, o mercado terá de iniciar um novo ciclo. Em São Paulo, isso está acontecendo desde 2017. Mas, no Rio, a situação política é muito grave. Então, estamos atrasados — conta Rubem Vasconcelos, presidente da Patrimóvel, principal imobiliária do mercado carioca. - Em 2018, haverá lançamentos. Serão poucos e muito bem estudados, já com novo preço. Mas a retomada de fato só deve vir em 2019.

Para atravessar esse “inferno astral” e reduzir o alto número de unidades em estoque, empresas do mercado imobiliário carioca adotaram estratégias de venda, como oferecer descontos de dois dígitos, apartamentos entregues mobiliados, um carro zero quilômetro como prêmio no ato da compra do apartamento e outros incentivos. Com isso, o preço dos imóveis caiu.

A carioca Carvalho Hosken, que tem uma imobiliária própria e desde 2012 trabalha com locação, criou um sistema que permite a quem aluga um apartamento da construtora abater até 30 meses de aluguel do pagamento do valor do imóvel, caso se decida por comprar a unidade. No ano passado, a Gafisa lançou projeto semelhante: em um ano de aluguel em um apartamento da incorporadora, o consumidor consegue até R$ 36 mil de desconto na hora de comprar a unidade. No mercado de locação, há contratos que preveem carência de três ou mais meses para pagar.

                             

Vendas da Ilha Pura serão retomadas

No país como um todo, a perspectiva de retomada em 2018 vem em grande parte pela volta do crédito. Em paralelo, a oferta de imóveis em estoque está decaindo. No Rio, também no estoque existe uma questão particular: a Ilha Pura, construída para abrigar os atletas na Olimpíada em 2016. O projeto, uma parceria da Carvalho Hosken com a Odebrecht Realizações, tem 3.600 apartamentos de alto padrão prontos para morar.

- A oferta de unidades do Ilha Pura afeta todo o mercado da Grande Barra da Tijuca. É uma situação desastrosa - diz uma fonte do setor que prefere não se identificar.

A Carvalho Hosken afirma que as vendas da Ilha Pura serão retomadas ainda neste semestre. Antes da Rio 2016, apenas 600 das 3.600 unidades foram ofertadas, sendo 40% delas - ou 240 - vendidas. A companhia, contudo, garante que não vai colocar todo o estoque de uma só vez no mercado: “O empreendimento foi estruturado para uma comercialização de longo prazo, de forma que seja possível contemplar uma curva de vendas coerente com o número de unidades e com a capacidade de absorção do mercado imobiliário local”, disse em nota.

Por ora, embora os indicadores gerais da economia apontem para um possível reaquecimento, a reação do mercado imobiliário brasileiro ainda é vista com ressalvas por especialistas e empresas do setor, especialmente por incertezas que afetam as decisões de investimento. É que, de um lado, a perspectiva da retomada na oferta de crédito, a queda no preço dos imóveis à venda e a taxa de juros em patamar mais baixo são vistos como sinais positivos e que pavimentam o caminho para a recuperação. De outro, o grande volume de imóveis em estoque em alguns mercados, como o Rio, e a falta de confiança do consumidor podem frustrar os mais otimistas.

Em 2017, o preço médio dos imóveis residenciais à venda no país registrou queda nominal (sem considerar os efeitos da inflação), pela primeira vez em dez anos, de 0,53%, segundo o Índice FipeZap. A queda real, porém, considerando a estimativa de 2,78% do IBGE de inflação para o ano, foi de 3,23%, bem abaixo da registrada em 2016, de 5,38%. É boa notícia para ao menos sete cidades no país, onde o preço médio já mostra recuperação. Em outras 13, a queda persiste. E o preço do metro quadrado no Rio registrou o maior recuo, encolhendo em 4,45%.

- No Rio, houve excesso de oferta no boom do mercado imobiliário, muitos projetos concentrados em certos bairros, principalmente na Zona Oeste. Os preços aceleraram demais, então, com o freio, também caem mais. O preço dos imóveis, geralmente, sobe puxado pelos lançamentos e pela demanda aquecida, e o Rio perdeu nesses dois vetores - explica Lucas Vargas, diretor executivo do Grupo ZAP Viva Real.

                   

Maior oferta de crédito puxa a recuperação

Leonardo Schneider, vice-presidente do Secovi-Rio, argumenta que a saúde do mercado imobiliário brasileiro foi afetada pela crise, que comprometeu a confiança do comprador:

- Muita gente colocou seus imóveis para vender e para alugar, então houve uma enxurrada de ofertas, mas a demanda está comprometida pelo aumento do desemprego e pela queda da renda dos brasileiros devido à crise. Com isso, os preços despencaram.

Eduardo Zaidan, vice-presidente de Economia do SindusCon-SP, confirma que a reativação dos lançamentos e das vendas na cidade de São Paulo é uma realidade desde o ano passado. É um movimento ainda tímido, diz ele, avançando sobre bases de comparação muito fracas, mas já há dinamismo:

- A retomada da Pró-Cotista traz fôlego ao mercado. Estamos em um momento de recomposição da renda das famílias, queda da inflação e da taxa de juros, melhorando a questão do endividamento. Mas a retomada no mercado imobiliário não será linear no país. A construção como um todo deve crescer 2% no país em 2018, se tudo der certo. É melhor? Sim. Mas ainda não dá para abrir um champanhe.

O anúncio mais promissor feito pela Caixa, avaliam profissionais do setor, foi o da elevação de 50% para 70% da margem de financiamento imobiliário. Em paralelo, o banco reabriu a linha de crédito Pró-Cotista, destinada a trabalhadores com contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), para aquisição de imóveis de até R$ 950 mil com as taxas mais baixas do mercado (8,66% ao ano), depois das praticadas para o Minha Casa Minha Vida. A Pró-Cotista estava suspensa desde junho de 2017, por falta de recursos. Além disso, o governo anunciou uma injeção de recursos de R$ 15 bilhões, o que pode sustentar a oferta de crédito durante o ano.

- É, enfim, ação de efeito. No longo prazo, se não tiver evento negativo no cenário macroeconômico que tenha desdobramento no setor imobiliário, o crédito será importante para reativar o mercado. Desde maio de 2015, após a primeira restrição na política de financiamento da Caixa, o mercado imobiliário está andando de lado no país - lembra Vargas, do ZAP Viva Real.

Alguns bancos privados reduziram as taxas de juros do crédito imobiliário no ano passado. Fabrizio Ianelli, superintendente executivo de Negócios Imobiliários do Santander, avalia que a reação em pedidos de financiamento ganhou fôlego:

- No segundo semestre de 2017, tivemos um aumento de mais de 200% na solicitação de crédito imobiliário, sobre o primeiro. Em julho, revisamos as taxas de financiamento para baixo, já atentos à melhora dos indicadores macroeconômicos.

                      

Fonte: O Globo, 10 de janeiro de 2018