OPINIÃO

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Atualmente, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) é o órgão responsável pela gestão de benefícios previdenciários do regime geral e de outros assistenciais.

Pouco antes da reforma previdenciária constitucional de 2019, a autarquia já apresentava dificuldades em gerir a demanda de requerimentos, vindo a acumular extensa fila de benefícios em análise.

Principalmente após a pandemia de Covid-19, colapsada em março de 2020, em face das medidas restritivas de circulação de pessoas, que visava a saúde e bem-estar coletivos, o INSS demonstrou não possuir competência gerencial para as novas demandas que surgiam, causando a crise nas análises administrativas vivenciadas até hoje pelos segurados que dele dependem.

A forma encontrada pela maioria dos países do mundo para continuar girando suas máquinas públicas foi o uso da tecnologia em automação. Entretanto, o Brasil não estava preparado para essa evolução tecnológica repentina.

Considerando que a maioria dos segurados do INSS que necessitam dos seus serviços são pessoas idosas ou deficientes, e que não há investimento de nenhuma das três esferas do governo em promover o desenvolvimento do conhecimento tecnológico no seu povo, essa parcela da população sofreu.

Sofreu por ter que apresentar requerimentos por telefone — através de um canal terceirizado da autarquia de péssimo funcionamento (Central 135, que somente aceita ligação de telefone fixo, em uma era que sequer telefones públicos mais existem), sofreu por ter que fazê-los por meio do "Meu INSS", canal digital do órgão, disponível por endereço eletrônico da internet ou por aplicativo de celular.

Em um país de dimensão continental, com boa parcela da população vivendo em situação de pobreza ou extrema pobreza, errou gravemente a autarquia ao limitar o atendimento presencial nas suas agências.

O cidadão que dela necessita, muitas vezes, não é alfabetizado, não possui um telefone celular, tampouco um computador com acesso à internet. Esse cidadão sempre utilizou os serviços da autarquia de forma presencial e experimentava facilidade na comunicação com o órgão.

Ainda em 2018, a análise de requerimentos era concluída na mesma semana do seu protocolo. Ou seja, fica muito claro que 1) as alterações promovidas pela EC nº 103/2019 — pois o órgão precisou ajustar seus sistemas de informática da Dataprev — seguidas das 2) restrições promovidas pela pandemia de Covid-19 e das 3) novas regras de acesso à autarquia foram extremamente prejudiciais ao segurado.

Os efeitos desse novo regramento de protocolo de requerimentos foi a má instrução dos processos administrativos, pois dependiam da juntada de documentos pelo próprio segurado, e o prejuízo financeiro do cidadão, vivenciado pela sua hipossuficiência tecnológica, ou porque não sabia ou porque não possuía condições de utilizar as plataformas disponíveis pelo órgão.

Nesse ínterim, com o protocolo do requerimento administrativo, o servidor responsável pela análise do caso deve, quando ausente algum documento necessário para a instrução do pedido e crucial para a efetiva análise do direito postulado, despachar requerendo a apresentação de tais itens, baixando o processo para cumprimento de exigência pelo segurado, sob pena de violação aos artigo 4º, incisos VI, VII, X e XIV, artigo 19, §2º e artigo 67, caput e §1º, todos da Portaria INSS/Dirben nº 993, de 28 de março de 2022, e responsabilização da autarquia pela ilegalidade perpetrada por seu agente.

Baixado em exigência, ou não, o servidor deverá proferir decisão fundamentada sobre o requerimento realizado, podendo ser o resultado favorável ao segurado ou à autarquia.

Lembra da fila extensa de benefícios em análise formada em 2019? Visando diminuí-la, o governo federal editou norma de premiação pecuniária para seus servidores por cada processo administrativo encerrado. E, sabe o que isso gerou? Gerou muitos indeferimentos automáticos de benefícios, com decisões sem a mínima fundamentação específica do caso, e sem oportunizar ao segurado a regularização da instrução processual com a baixa do PAP/PAA em exigência.

Por sorte, em alguns casos, esse cenário de indeferimento é reversível.

E, aqui, vai a dica aos colegas que militam na área: procure reabrir requerimentos de seus clientes através de revisão de ato de indeferimento de benefício, pedindo a retroação da DIB para a DER daquele primeiro requerimento em que o segurado preencheu os requisitos do benefício, mas a autarquia não fez a correta análise do pedido, bem como o pagamento dos atrasados desde essa DER.

Não se esqueça: a decadência de dez anos, instituída pela Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18 de junho de 2019, não se aplica à esta revisão em virtude da ADI 6096. Contudo, o julgamento em questão não modificou a aplicação da decadência para revisão de ato de concessão de benefício, pois manteve a redação original do artigo 103 da Lei nº 8.213/91.

Ademais, a legislação aplicável a cada caso é aquela da época em que o segurado preencheu os requisitos do benefício pretendido, independente da DER e da DIB.

Consoante previsão expressa da Portaria Dirben/INSS nº 997/2022, a possibilidade de pedido de revisão do ato de indeferimento é cristalina, senão vejamos:

"Artigo 8º Os benefícios indeferidos poderão ser revisados, devendo ser observado o seguinte:
I - Se não houver apresentação de novos elementos, o INSS efetuará análise do ato do indeferimento; ou
II - Se houver apresentação de novos elementos, o pedido será analisado como novo requerimento, ressalvado o disposto no §1º.
§1º No procedimento de revisão de benefício indeferido deverá ser verificada a possibilidade de reforma do ato com os elementos originários do processo, situação em que será mantida a DER inicial e desconsiderados os novos elementos apresentados, uma vez que os feitos financeiros serão desde a DER,
§2º Para fins de atendimento ao inciso II, em sendo verificada a possibilidade de deferimento, deverá ser solicitada anuência do requerente quanto a reafirmação da DER para a Data do Pedido da Revisão (DPR)."

Tal entendimento não era diferente na IN 77/2015, senão vejamos:

"Artigo 561. No caso de pedido de revisão de ato de indeferimento, deverão ser observados os seguintes procedimentos:


I – sem apresentação de novos elementos, o INSS reanalisará o ato, observado o prazo decadencial;
II - com a apresentação de novos elementos, esgotada a possibilidade de revisão do ato com os elementos originários do processo, o pedido será indeferido, e o servidor orientará sobre a possibilidade de novo requerimento de benefício, com fundamento no §2º do artigo 347 do RPS.


Parágrafo único - Quando a decisão não atender integralmente ao pleito do interessado, o INSS deverá oportunizar prazo para recurso


Art. 568, § único. Em se tratando de pedido de revisão de benefícios com decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo, em que não houver a interposição de recurso, o prazo decadencial terá início no dia em que o requerente tomar conhecimento da referida decisão."

Veja que, nos casos em que não existir inovação documental, tão somente erro de avaliação do direito pela autarquia, o expediente deve ser recebido e conhecido como pedido de revisão do ato de indeferimento.

Na remota hipótese de se entender que não é cabível o pedido de revisão do ato de indeferimento, o requerimento deve ser recebido como recurso ordinário administrativo, reconhecendo-se o direito já na APS do INSS, desde que apresentada no prazo legal. Fora do prazo recursal, deve ser apresentada apenas como revisão, e subsidiariamente, o advogado deve requerer seu conhecimento como novo pedido.

Na prática, encontramos duas situações: 1) a de um PAP/PAA em curso e devidamente instruído, mas mal analisado pela autarquia e indeferido pelo servidor — que deve ser peticionado no sentido da reanálise do mérito ainda na APS, sem precisar remeter os autos à JR, acrescida de protocolo de recurso nos mesmos termos, e 2) a de um PAP/PAA indeferido e encerrado por erro da autarquia — que deverá sofrer protocolo de revisão de ato de indeferimento, acompanhado de novo requerimento de concessão de benefício, visando evitar novo indeferimento pelo INSS e, futuramente, judicial, ou contratempos com os efeitos financeiros do pedido.

Veja-se que, de acordo com a Portaria Dirben/INSS nº 996/2022, mesmo após a instrução do Recurso Ordinário, a agência do INSS pode reconhecer o direito do segurado, deixando de encaminhar o recurso para a Junta de Recursos. É o que prevê seus artigos 11, 30, 31 e 32.

Na mesma toada, a Portaria MTP nº 4.061/2022, em seu artigo 66. Vide também artigo 578 e 583 da IN nº 128/2022, artigo 32, §1º do Decreto 6.214/2007, artigo 17 da Portaria Dirben/INSS nº 996/2022 e artigo 61 da Portaria MTP nº 4.061/2022.

Dessa forma, instruído o recurso, cabe à agência do INSS reanalisar o direito do segurado e, caso reconhecido, implantá-lo, sendo necessária sua remessa à Junta Recursal somente na hipótese da APS não se convencer do reconhecimento do direito.

Quanto ao pagamento das parcelas oriundas da retroação da DIB, devidas desde a DER do benefício que está sendo revisto, é entendimento pacificado nos tribunais a obrigação da autarquia, observada a prescrição quinquenal prevista no parágrafo único do artigo 103 da Lei nº 8.213/91. Informação importante caso o INSS conceda a DIP em data diferente da DER.

Fecho sugerindo que estejamos atentos às peculiaridades do caso de cada cliente. Procure sempre reabrir requerimentos indeferidos, mediante minuciosa análise da possibilidade. Você pode estar deixando dinheiro na mesa!



 é advogada especialista em Prática Previdenciária e membro da Comissão de Direito Previdenciário da 58ª Seccional da OAB/RJ.

Revista Consultor Jurídico

https://www.conjur.com.br/2023-mar-19/isabella-marcondes-retroacao-data-inicio-beneficio-inss