“Quando você ganha um monte de dinheiro fazendo especulação sem produzir nada e ainda por cima não paga imposto, sinceramente não tem como funcionar”. A afirmação é do economista e professor titular de pós-graduação da PUC/SP, Ladislau Dowbor, no painel “Tributar os Super-Ricos e o Capital Improdutivo”, que foi transmitido na última quinta-feira. A live faz parte da série de diálogos “Que os super-ricos paguem a conta”, da Campanha Tributar os Super-Ricos e entidades parceiras.

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Coordenadora do painel, a vice-presidente do Instituto Justiça Fiscal (IJF), Maria Regina Paiva Duarte, enumerou as propostas apresentadas no Congresso pela campanha Tributar os Super-Ricos, como corrigir as distorções da tabela do Imposto de Renda e instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas. “As eleições são uma oportunidade para impulsionar o debate sobre esse tema crucial. Cada um pode contribuir com essa mudança condicionando seu voto a quem defende a redução da desigualdade com justiça fiscal”, pontuou a dirigente.

Para o economista, a tragédia da desigualdade no Brasil não é resultado de falta de recursos, mas das decisões políticas. O PIB de 2021 foi de R$ 8,7 trilhões. Dividir esse valor pela população do país dá R$ 13 mil por mês por família de quatro pessoas, contabiliza. “Dá para todo mundo viver de forma digna e confortável, bastando reduzir a desigualdade moderadamente. A desigualdade se aprofundou num país relativamente bem-sucedido. É uma escolha política fazer isso”, pontua.

“Temos os recursos, sabemos o que deve ser feito, temos todos os dados. Podemos perfeitamente assegurar que o conjunto da população tenha uma vida digna e confortável. A reorientação política é fundamental para alterar o cenário, mas precisa, além de um governo, de uma nova geração de legisladores que faça essas mudanças”, estima.

Para o economista, o dinheiro tem que ser produtivo. Ele lamenta que até mesmo os investidores na produção estão optando por ganhar dinheiro com a especulação financeira. “No Brasil a empresa produtiva não tem mercado e a agiotagem sobre o investimento no crédito bancário tem uma taxa média de 58%. Não pode uma economia funcionar assim”, enfatizou o escritor que disponibiliza toda sua obra online.

Para Dowbor, é inadmissível ter 33 milhões de brasileiros passando fome, entre eles seis milhões de crianças, enquanto o país produz 3,7 kg de grão por pessoa por dia, mas privilegia a exportação.

“A partir de um certo grau de desigualdade a democracia não funciona. É preciso ter certa democracia econômica para existir democracia política. Se não é farsa”, registra. Para ele, a economia tem que gerar bem-estar para a população. Lembrou que 42 bilionários, sem produzir e sem pagar imposto, aumentaram suas fortunas em R$ 180 bilhões em apenas quatro meses de pandemia, valor correspondente a seis anos do Bolsa Família destinado a 50 milhões de pessoas.

Cinco bancos no Brasil detêm 87% das operações financeiras cobrando altos juros. “É preciso encontrar alguma forma de controlar a agiotagem”, defende o autor do livro “A Era do capital improdutivo”. Dowbor demonstra a iniquidade da apropriação das riquezas pelo sistema financeiro sem nenhum retorno para o país.Ele relembrou o absurdo da mudança do Artigo 192 da Constituição Federal, deixando de ser crime a usura e a agiotagem. “Foi aprovado no Congresso pelo oligopólio dos bancos. Se apropriaram da política”, reforça o economista.

“Estão se aproveitando para desmontar a Constituição. Essas pessoas podem elevar o juro ao que quiserem, transferir dividendos e juros que quiserem, utilizar paraísos fiscais e está tudo legal?”, se indigna o professor, destacando que é preciso resgatar o Legislativo da elite econômica.

Criticou a agiotagem, o sequestro do setor político pela elite econômica que muda leis para congelar o sistema de espoliação vigente. “Estão privatizando e mudando leis para congelar o sistema de dreno que se construiu”, resume. Enquanto os juros rotativos no cartão de crédito chegam a 390% ao ano no Brasil, no Canadá a taxa é de 11%, exemplificou.

Para quem faz uma aplicação financeira de R$ 1 bilhão com uma taxa moderada de 5% ao ano, ganha R$ 137 mil ao dia. “Sem produzir nada e sem pagar imposto. E quando vê mendigo na rua diz: vai trabalhar vagabundo! Isso tem uma dimensão ética fundamental: o pobre não é culpado da pobreza e o rico não merece essa riqueza”, sentencia Dowbor.

Lembrou ainda da lista de 315 bilionários brasileiros publicada recentemente pela revista Forbes. “Dá pra contar nos dedos os que fazem alguma coisa”, observou. “Quem faz aplicação financeira não é investidor porque não gera nada. Está ganhando dinheiro com dinheiro”, evidencia. “E são eles que detém o poder real”, lamenta o autor de mais de 50 livros, todos disponíveis digitalmente.

Para a dirigente do IJF, a tributação dos super-ricos deve ser prioridade para enfrentar a desigualdade, o principal problema brasileiro. Deve fazer parte de um projeto de país, servindo como instrumento potente e eficaz de redistribuição.

Maria Regina destaca que a Campanha Tributar os Super-Ricos protocolou os projetos em setembro de 2021 por meio de um conjunto de parlamentares e propõe reestruturar a tabela do IRPF, elevando as alíquotas para as altas rendas e ampliar a faixa de isenção para os que menos ganham.

Defende ainda a criação de uma contribuição maior para quem ganha mais de R$ 720 mil anuais; elevar as alíquotas sobre heranças e doações para até 30%, progressivamente, e elevar a alíquota da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) do setor financeiro e extrativo mineral, além da revisão e maior transparência para as renúncias fiscais.

FonteIJF, com Monitor Mercantil
Data original da publicação: 07/09/2022

DMT: https://www.dmtemdebate.com.br/para-ladislau-dowbor-vivemos-a-apropriacao-financeira-por-parasitas/