Por Marcelle Gutierrez, Valor 

O anúncio hoje do presidente Jair Bolsonaro sobre o Renda Brasil causou estresse no mercado financeiro, mas não pelo fim das discussões em torno do programa social, mas sim pela forma como foi feito. Segundo Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset, o anúncio deixou a sensação de atrito maior entre o presidente, que rechaçou um possível congelamento de aposentadorias, e a equipe econômica, liderada por Paulo Guedes.

“A sinalização de que não terá Renda Brasil seria até positiva, porque tira a pressão fiscal, mas a maneira como ocorreu trouxe a preocupação de como as coisas vão evoluir daqui para frente”, diz o economista.

Logo após as declarações de Bolsonaro, publicadas em vídeo no Twitter, o dólar comercial e os juros futuros passaram a subir, enquanto o Ibovespa bateu a mínima do dia, aos 99.647 pontos (-0,63%).

Por volta das 16h50, o Ibovespa tinha leve queda de 0,04%, aos 100.231 pontos. Já o dólar comercial subia 0,04%, a R$ 5,2779. Nos juros futuros, o DI para janeiro 2025 ia de 5,93 na sessão anterior para 6,010.

O economista-chefe da Western Asset lembra que a situação fiscal do país já era ruim antes da pandemia, mas tinha direção positiva com o teto de gastos e reformas. Com a pandemia, a resposta precisou ser forte, o que jogou a dívida para perto de 100% do Produto Interno Bruto (PIB).

Logo, a equipe econômica começou a realizar estudos para implementar programas sociais, principalmente o Renda Brasil, sem afetar o orçamento. Mas o presidente começou a vetar nas últimas semanas essas sinalizações, como o uso do abono salarial, do seguro defeso e hoje a ideia de congelar aposentadorias. Isso, segundo ele, gera incertezas sobre os próximos passos.

Apesar da volatilidade causada nos ativos brasileiros, Lima afirma que não teve a sensação de que o ministro Paulo Guedes foi desautorizado, tanto que na sequência ele deu declarações sobre o assunto em evento.

“Ele tentou transparecer tranquilidade, mas o que o mercado agora quer são soluções, não apenas projetos”, afirma o economista, que acrescenta: “Qual o projeto e como o governo vai sentar para negociar no Congresso o que quer? Tudo isso é muito importante para a redução dos prêmios.”

Para a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), cujo resultado sai amanhã, Lima acredita em manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 2% ao ano, já que a economia “saiu do limbo” e a inflação está sob controle, embora haja pressão pontual em alimentos.

“O Banco Central já trouxe questões institucionais em outros comunicados, como a incerteza que vai causar nos funcionamentos dos mercados se a taxa cair abaixo de 2%. Quando traz isso a tona, mostra que há uma preocupação e faz sentido esperar”, detalha.

(Com conteúdo publicado originalmente no Valor PRO, o serviço de notícias em tempo real do Valor)