OPINIÃO

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A discussão sobre o índice de correção a ser aplicado nos débitos trabalhistas atrai muita discussões desde 2015, quando essa polêmica teve início. Já tive oportunidade de escrever outros artigos na ConJur justamente sobre esse tema e creio que ele merece ser visto e analisado tanto por aqueles que concordam com a adoção pelo IPCA-E quanto por aqueles que não concordam com sua adoção.

Em recente decisão, o ministro Gilmar Mendes suspendeu o julgamento de todos os processos na Justiça do Trabalho que envolvessem a aplicação dos artigos 879, §7º, e 899, §4º, ambos da CLT, que determinam TR (taxa referencial) como índice de correção monetária a ser adotado em débitos trabalhistas.

Em seguida, uma série de artigos condenando a decisão do ministro e defendendo o IPCA-E como índice de correção foram publicados, mas enquanto muitos articulistas se prendem a tecnicidades e sequestram a interpretação jurídica como forma de evitar que o debate se dê no mundo real, a verificação prática fica em segundo plano.

Quando se argumenta que a decisão do ministro traz insegurança jurídica, é preciso ser relativizado. Afinal o que atrai mais insegurança jurídica não é o TST não respeitar o que está na CLT, que determina expressamente que a TR deve ser o índice de correção dos débitos trabalhistas?

É possível estender a dialética de conceitos e interpretações jurídicas por muito tempo, mas creio que os fatos simples trarão mais resultados à compreensão de todos.

A TR, criada 1991, tinha o objetivo de evitar o processo de reindexação inflacionaria da economia que naquele ano foi de 472%, nasceu como uma taxa referencial de juros e depois passou a ser utilizada como índice de correção, mas que não retroalimentava a inflação. Portanto, ela não tem o objetivo de repor a inflação, exigir isso deste índice é irreal, além disso no rito de execução da Justiça do Trabalho há outros mecanismos que garantem isso.

Reforço que diferente do discurso adotado pelos defensores do IPCA-E, não há perda de valor dos trabalhadores quando da execução de seus créditos.

Na Justiça do Trabalho, o cálculo de execução de um débito trabalhista considera como base o salário do trabalhador. Dessa forma, se um trabalhador promoveu uma reclamação trabalhista contra a empresa em 2017 e a decisão promulgada deu ganho de causa a ele por horas extras, por exemplo, a base para o cálculo das horas extras não é o salário de 2017, mas o de hoje.

Ora, se é recorrente que os sindicatos e trabalhadores obtém reajustes superiores à inflação, a atualização já ocorreu neste momento.

Além disso, os juros nas demandas da Justiça do Trabalho são de 12% ao ano, ou 1% ao mês, se esse percentual já era alto anteriormente, hoje, com uma taxa Selic de 2%, representa seis anos de juros.

O TST, quando entendeu adotar a decisão do STF pela adoção do IPCA-E nos precatórios, não observou que os juros praticados pelo governo são de 6%, ainda assim, "após o período de graça" como decidido recentemente.

Para ilustrar, vamos considerar 2 hipóteses; I) a primeira é de um trabalhador que acionou a empresa em 2 janeiro de 2016 reclamando um salário que naquela data era de R$ 3 mil; II) a segunda é de um cidadão que tem um crédito de R$ 3 mil junto à Fazenda Pública.

Na hipótese do trabalhador em fevereiro de 2020, ele teria direito a um crédito atualizado, considerando a TR como índice, de R$ 6.019. E o cidadão que tinha um crédito contra a Fazenda Pública teria um crédito em fevereiro de 2020, considerando a correção pelo IPCA-E acrescida de juros de 0,5% ao mês, de R$ 4.485.

A diferença entre o trabalhador e o cidadão nesse exemplo é muito grande, alcança o valor de R$ 1.534, ou seja, o trabalhador vai ter direito a um crédito 34,2% maior do que o cidadão.

Essa diferença enorme foi calculada utilizando a TR como índice de correção do débito trabalhista, portanto é falso o argumento de que a TR prejudica o trabalhador nos cálculos trabalhistas.

A prática de juros de 12% ao ano e atualização da base de cálculo do salário do trabalhador dão um benefício adicional aos reclamantes e acrescentar a esse cenário o IPCA-E não tem nenhum sentido econômico, uma vez que não há, de fato, prejuízo.

Acredito que deveria não só ser mantida a TR como índice como os legisladores deveriam reduzir os juros na esfera trabalhista para 6% ao ano, e não mais 12%, como é hoje. 

 é economista, MBA internacional FGV/University of Chicago e fundador da Moneyus Consultoria Financeira.

Revista Consultor Jurídico