Para Guilherme Mello, da Unicamp, Paulo Guedes percebeu que não conseguirá segurar a flexibilização do teto de gastos e decidiu cobrar preço alto, exigindo o avanço de suas pautas.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, está usando a debandada de membros da sua equipe para pressionar o governo e o parlamento em favor de sua agenda. É a avaliação do economista Guilherme Mello, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que vê nas declarações recentes de Guedes um movimento para negociar a preservação de parte da pauta liberal.

Na terça-feira (11), Salim Mattar, da Secretaria Especial de Desestatização e Privatizações, e Paulo Uebel, da Secretaria Especial de Desburocratização, pediram demissão insatisfeitos com a lentidão da agenda de privatizações e da reforma administrativa. Em uma fala cheia de recados, Paulo Guedes falou em “debandada” e afirmou que quem aconselhava Jair Bolsonaro a romper o teto de gastos levava o presidente da República ao caminho do impeachment.

Na avaliação de Mello, Paulo Guedes percebeu que não conseguirá segurar a flexibilização do teto de gastos, já que as eleições municipais estão às portas e Bolsonaro precisa de dinheiro para ter o que mostrar em 2022. Assim, ciente da derrota, Guedes decidiu cobrar um “preço alto”, exigindo o avanço de pautas que lhe são caras ou, pelo menos, a garantia de que serão retomadas mais adiante.

Esse seria o sentido das declarações do ministro, que chegaram a ter um tom de ameaça. Além da referência ao impeachment, Guedes citou nominalmente o presidente e disse que é ele quem dá as cartas. A reforma administrativa, por exemplo, está engavetada por decisão exclusiva de Bolsonaro. Para Guilherme Mello, a estratégia de Guedes é coerente com o estilo das disputas no governo.

“Este é um governo descentralizado e fraco, tem várias alas. É muito explícita a descoordenação e a disputa é feita à luz do dia, as chantagens. Não há pudor, não há uma hierarquia”, comenta.

Na noite desta quarta (12), Bolsonaro reuniu-se no Palácio do Planalto com seus ministros e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e, após o encontro, reafirmou genericamente o compromisso de seu governo com o teto de gastos e com a responsabilidade fiscal. Maia e Alcolumbre também fizeram declarações nesse sentido.

Foi uma tentativa de demonstrar união dentro do governo e entre os Poderes e acalmar temores do mercado, que reagiu com nervosismo às declarações de Paulo Guedes. No entanto, Bolsonaro não deu sinalizações claras sobre a reforma administrativa, as privatizações ou sobre o Pró-Brasil, o programa de retomada econômica que tem sido o pomo da discórdia entre Paulo Guedes e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, pelo risco de “furar” o teto.

Segundo Guilherme Mello, não há a possibilidade de conciliar o teto, que atrela o aumento do gasto público à inflação até 2036, e o investimento público que será necessário no período pós-pandemia. “O [ministro da Infraestrutura] Tarcísio [Freitas], o Rogério Marinho, defendem a flexibilização do teto para abrir espaço para um ‘pacotinho’ de investimentos. Eles perceberam que a estratégia do setor privado faz-tudo não estava dando certo e dará menos ainda no pós-pandemia”, afirma.

O palpite do economista é que, mesmo que perca algum terreno, Guedes permanecerá no governo na esperança que implementar seu programa mais adiante. “O Guedes tem a noção de que isso [garantir recursos para estimular a economia e para programas sociais] é importante para a sobrevivência política do Bolsonaro. Ele quer ceder um pouco e ganhar muito”, avalia.

Vermelho