Apesar de os países não terem rompido acordo comercial, a troca de farpas entre Washington e Pequim preocupa por aumentar a imprevisibilidade econômica.

Não bastasse a recessão e o freio no comércio internacional, a pandemia da Covid-19 ainda elevou as tensões entre Estados Unidos e China, criando incerteza que pode travar os investimentos globais e respingar no Brasil. A trégua iniciada em dezembro, com um acordo comercial para pôr fim à guerra entre as duas potências, foi abalada pela pandemia do novo coronavírus.

A análise está em matéria do Estadão. A reportagem ouviu o economista Guilherme Martins, superintendente de pesquisa econômica do Itaú Unibanco, a escalada do tom de Washington no último mês é “preocupante”. “Achávamos que o acordo entre os países era temporário e que as tensões poderiam voltar nos próximos anos, mas isso aconteceu antes do esperado.”

Segundo cálculos do Itaú, a guerra comercial já retirou, entre 2018 e 2019, de 0,5% a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) global. O embate comercial foi, portanto, um dos responsáveis pela desaceleração da economia mundial de 3,6% em 2018 para 2,9% no ano passado.

Apesar de os países não terem rompido com a fase um do acordo, a troca de farpas entre Washington e Pequim preocupa por aumentar a imprevisibilidade econômica. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, constantemente provoca o país e culpa os chineses pela disseminação do coronavírus, tentando esconder a inépcia de seu próprio governo contra a doença.

Nesta terça-feira (23), as bolsas da Ásia fecharam em alta após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reafirmar que o acordo comercial preliminar de Washington com a China permanece em vigor.

Na última sexta-feira (19) a notícia de que o governo chinês aceleraria compras de bens agrícolas dos EUA também animou o mercado. O jornal ressalta, no entanto, que essa decisão de Pequim não amenizará a tensão, que está longe do fim. Lembra que no mesmo dia, o secretário de segurança americano, Mike Pompeo, voltou a culpar a China pela pandemia.

“O comércio exterior cresce quando se tem previsibilidade. O risco de uma nova guerra comercial é precificado no valor do seguro, do frete, da venda. A tensão entre os países é um fator de instabilidade super indesejado no momento em que já há redução do comércio”, diz Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento.

Consequências para o Brasil

Na segunda (22) o mercado chinês era o maior importador de produtos brasileiros, tendo sido responsável pela compra de 39% do total exportado pelo país de janeiro a maio.

“Se os EUA começarem a interferir no que a China está fazendo, a China pode desacelerar de forma geral, o que seria muito ruim para o Brasil. A demanda da China depende de quão rápido ela pode crescer”, diz o economista-chefe do banco MUFG (antigo Banco de Tokyo) na Ásia, Cliff Tan.

Para Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil nos EUA, a situação entre EUA e China é “muito tensa e vai piorar”. “A relação ficou mais complicada por causa das eleições americanas, depois veio a crise em Hong Kong e o coronavírus. Donald Trump está fazendo da campanha contra a China, sua principal plataforma. Joe Biden [candidato democrata à presidência americana] vai fazer a mesma coisa, já que a China é uma ameaça à supremacia dos EUA. Haverá efeito comercial e político nos próximos anos”, diz.

Fonte: Estadão