Joao Teixeira Junior

Explorados em meio a pandemia, os entregadores por aplicativo convocam greve nacional por melhores condições de trabalho. Por que não se garantir os direitos básicos e o mínimo de dignidade a esses trabalhadores?

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Explorados em meio a pandemia, os entregadores por aplicativo convocam greve nacional para o dia 1º de julho por melhores condições de trabalho. Na escalada da precarização do trabalho, qual seria o impacto econômico e social ao se garantir os direitos básicos e o mínimo de dignidade a esses trabalhadores?

Todos devem se lembrar que o discurso pró Reforma Trabalhista, em resumo, defendia a "modernização da legislação", a retirada de direitos dos empregados e a promessa de criação de milhões de empregos formais1.

Porém, passados quase três anos de sua aprovação, os números comprovam que a Reforma Trabalhista retirou direitos, não criou os empregos que prometeu e ainda produziu uma vasta multidão de trabalhadores informais - notadamente aqueles que prestam serviços por aplicativos2.

Esses trabalhadores informais e suas famílias não tem absolutamente nenhum direito, nenhuma garantia de salário mínimo e nenhuma assistência social em caso de desemprego, doença, acidente e até mesmo morte.

A vulnerabilidade fica mais explícita durante a pandemia. Trabalhadores estão mais expostos, arriscando a própria saúde e a vida, bem como de seus familiares, sem nenhuma proteção legal, trabalhando ainda mais e ganhando menos!3.

Salário mínimo, limitação de jornada, folgas, horas extras, férias, 13º salário, FGTS, aposentadoria, adicionais noturno, de insalubridade e de periculosidade, afastamento remunerado e seguro social em caso de doença ou acidente4...

Todos esses direitos mais básicos, que garantem o mínimo de dignidade ao trabalhador, é considerado um luxo praticamente inalcançável para essa modalidade de trabalho precário.

Veja que trabalhador não sabe sequer como é calculada a sua remuneração pelo trabalho efetivamente prestado, pois ele não tem acesso aos valores pagos pelos clientes às empresas. Ou seja, se pagamos 10 reais de taxa de entrega, não significa que o trabalhador tem conhecimento disso e que vai recebê-la integralmente. A informação não é divulgada de forma clara e transparente, impedindo o trabalhador de saber até mesmo a base de sua remuneração.

Note, tampouco sabemos, enquanto consumidores, qual valor da taxa vai para o aplicativo, para o restaurante, para o governo (impostos), para a administradora do cartão de crédito e muito menos para o entregador.

É evidente a falta de transparência.

Talvez, o mais cruel por trás disso tudo seja o marketing feito para "glamurizar" ou "romantizar" essa relação de trabalho indigna. "Trabalhe para você mesmo. Seja seu próprio chefe. Seja dono do seu próprio negócio! Ganhe quanto puder!" Isso esconde uma lógica absolutamente perversa de precarização do trabalho, colocando o trabalhador numa situação de extrema vulnerabilidade e indignidade, à margem da proteção legal.

Então, se essa modalidade de trabalho informal é tão ruim e prejudicial aos trabalhadores e somente beneficia as grandes corporações de aplicativos, por que não se discutir a sério e profundamente uma legislação especial que garanta o mínimo de proteção digna para esses trabalhadores?

Por que não se garantir direitos básicos que assegurem o mínimo – repita-se o mínimo! – de dignidade?

Aqui se inclui limitação de jornadas, intervalos para refeição e descanso, folgas e horas extras, alimentação, férias e 13º salário. E porque também não aposentadoria e seguro social em caso de doença, acidente, morte e desemprego.

Quão benéfico seria para economia do país registrar a carteira dos milhões de trabalhadores por aplicativo? Quão positivo seria o impacto econômico e principalmente o impacto social para vida de milhões de trabalhadores brasileiros e de suas famílias?

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1 Diversos políticos, enfáticos da Reforma, afirmaram que a aprovação da Reforma Trabalhista iria gerar de 2 e até mesmo de 6 milhões de empregos. Acesso em 14.6.2020.

2 Sobre o aumento da informalidade, há interessante reportagem da Folha de São Paulo/UOL, com base nos estudos fornecidos pelo próprio Governo Federal, através do IBGE e CAGED, comprovando o aumento da informalidade e perca de renda do trabalhador um ano após a Reforma Trabalhista, acesso em 14.6.2020.

No mesmo sentido, a reportagem do Nexo Jornal também se baseia nos dados informados pelo Governo Federal, via IBGE, comprovando o aumento da informalidade e diminuição da renda do trabalhador, resultado da precarização do trabalho. Acesso em 14.6.2020

3 Notícia da BBC Brazil em que é exposta a perversidade desse modelo de negócio, onde o trabalhador se expõe ao perigo, sem nenhuma garantia, trabalhando mais que o normal, mas ganhando menos. Acesso em 14.6.2020.

4 Interessante a notícia da revista Exame que aborda o lado sombrio de trabalho para aplicativo e ainda mostra como ele é mais cruel para as mulheres. Acesso em 14.6.2020.

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t*João Teixeira Júnior é advogado, sócio do escritório João Teixeira Júnior Advocacia. Membro da Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo – AATSP. Especializando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela PUC-SP.

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