Paulo Guedes está em guerra com o ministro do Desenvolvimento, Rogério Marinho, que quer implementar o plano Pró-Brasil. Mercado viu com ceticismo esforço de Bolsonaro para mostrar que está tudo bem.

O ministro da Economia, Paulo Guedes - Arte: Paula Cardoso (sobre foto de CJPress/FolhaPress)

Após a saída de Luiz Henrique Mandetta e Sergio Moro do governo, Jair Bolsonaro correu para afastar os rumores de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, também estaria prestes a deixar o cargo. Garantiu, na semana passada, que Guedes é o “homem que decide sobre a economia”. O ministro, que andava sumido dos eventos públicos, logo apareceu ao lado dos companheiros de Esplanada que pareciam contrariar a agenda de ajuste fiscal, para reforçar o discurso de que o “Posto Ipiranga” continua no comando.

Nos bastidores, é sabido, porém, que Guedes ainda não engoliu a ideia do Pró-Brasil, o plano de recuperação econômica que foi chamado pela imprensa de protocolo de intenções, de tão pífio e vago. No entanto, ouriçou o ministro da Economia porque a ideia seria contar com financiamento público, algo que Paulo Guedes abomina.

Por isso, rompeu com o idealizador da proposta: o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, principal articulador do governo no Congresso na reforma da Previdência. Segundo líderes do Centrão, grupo fisiológico de partidos que está com trânsito livre no Planalto, Marinho continua peça-chave na negociação para aprovar no Congresso a agenda de reformas.

O atrito entre Paulo Guedes e Rogério Marinho veio à tona logo na saída de Sergio Moro do governo. Naquele dia, Bolsonaro reuniu todos os ministros para lançar um discurso de resposta ao ex-titular da pasta de Justiça e Segurança Pública, mas Guedes roubou a atenção. Não apenas por ser o único ministro de máscara, sem terno e de sapato que parecia uma meia, mas porque, antes de entrar em cena, negou-se a conversar com Marinho.

Guedes teria chamado o ministro do Desenvolvimento Regional de “desleal” e “despreparado”. O chefe da equipe econômica não concorda com a proposta de investir R$ 30 bilhões em obras públicas em um plano de retomada no pós-coronavírus, como prevê o Plano Pró-Brasil, apresentado pela Casa Civil do general Braga Netto, mas concebido prioritariamente por Marinho.

Enquanto outros países estão emitindo moeda e aumentando a dívida pública para enfrentar a pandemia, a equipe econômica, que segue paralisada e obcecada pela austeridade fiscal, afirma que o governo não tem dinheiro para executar plano algum. Por isso, seria obrigado a se endividar mais e a estourar o teto de gastos, outra obsessão de Guedes e companhia.

Paulo Guedes considera que essa não é a melhor maneira de superar a crise da Covid-19. O ministro fez questão de deixar isso claro, comparando o Pró-Brasil ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do PT e da ex-presidenta Dilma Rousseff. “O caminho do investimento público, o PAC, foi trilhado para o buraco. A solução não pode ser cavar mais fundo, repetir a estratégia, fazer um novo PAC”, disse Guedes, em uma live com o setor varejista.

Relator da reforma trabalhista de Michel Temer, que tirou direitos dos trabalhadores, Marinho não conseguiu a reeleição como deputado federal do Rio Grande do Norte pelo PSDB. Foi para o governo Bolsonaro graças a Guedes. Era secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia antes de ser conduzido ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com o apoio do Centrão. Foi neste cargo, durante a aprovação da reforma da Previdência, que se sagrou como um dos principais articuladores do governo no Congresso.

Cientes do papel de Marinho junto aos parlamentares — uma vez que Guedes não dispõe da mesma habilidade política — os líderes do governo no Congresso têm tentado minimizar o desconforto entre os dois. Paulo Guedes, no entanto, ainda não deixou o clima de insatisfação baixar. “Alguns ministérios estão vislumbrando novos espaços de ação, mas isso precisa caber no nosso plano. Seria muito oportunismo político trazermos uma farra eleitoral para se engrandecer e colocar em risco o próprio governo”, alfinetou em coletiva de imprensa realizada no Planalto. “Eu nunca ofendi ou rompi relação com ninguém. Mas, quando alguma proposta extrapola a Lei de Responsabilidade Fiscal ou se há um incentivo perverso, eu não posso avançar”, acrescentou, no dia seguinte. Já Rogério Marinho não escondeu nos bastidores o descontentamento com a falta de diálogo e o trato com Guedes, “que não é virtuoso em temperamento”.

Analistas do mercado financeiro admitem que os acenos de Bolsonaro a Guedes permitiram a reversão de parte das perdas registradas pela Bolsa de Valores, depois da apresentação do Pró-Brasil. Mas seguem de olho nos ânimos do governo para definirem o rumo dos investimentos, ainda mais neste momento em que o presidente também parece disposto a se aproximar do Centrão, notório sedento por cargos e investimentos.

“Bolsonaro se preocupou em mostrar ao mercado que não haverá mudança na economia agora, mas esse gesto também foi visto com certo ceticismo. Conhecemos o histórico do presidente e sabemos que, uma hora, o governo chegará a uma encruzilhada por conta dos planos para a retomada. Haverá pressão pelo aumento dos gastos públicos, que vai na contramão do que o ministro Guedes defende. O governo precisará se posicionar em algum momento”, disse o diretor de câmbio da FB Capital, Fernando Bergallo.

Com informações do Correio Braziliense