OPINIÃO

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Repetidas vezes e de forma enfática o presidente Jair Bolsonaro tem insistido na tese da chamada quarentena vertical" para enfrentar a gravíssima crise de saúde imposta pela pandemia, provocada pelo coronavírus, que causando a doença categorizada como Covid-19 já ceifou a vida de centenas de brasileiros e se não tomar-se as devidas precauções, pode atingir até 1 milhão de pessoas no território nacional, segundo o presidente da Organização Mundial de Saúde.

O presidente da República contrapõe-se à recomendação mundial de "quarentena horizontal" essa sim respeitante à igualdade de condições de cidadania, Constituição Federal em seu artigo Artigo 5ºTodos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdadeà segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

Segue a isso os repetidos episódios em que o presidente desmereceu a gravidade do coronavírus, criou atritos, acusou outros poderes de utilizarem politicamente a pandemia e várias vezes desrespeitou as diretrizes mundiais de combate à Covid-19, criando ambientes de aglomeração. Além disso, recebeu reclamações dos próprios líderes governamentais por não coordenar corretamente as diferentes instâncias de governo, sejam governos estaduais ou municipais.

O presidente pretende que alguns cidadãos que ele engloba no nicho de "grupo de risco" sejam confinados, obrigatoriamente, em suas residências ou sejam retirados de suas atividades sociais rotineiras, violando inclusive outros direitos fundamentais garantidos pela nossa constituição como o inciso XV do artigo 5º que reza sobre a liberdade de locomoção. Um dos elementos que tipificam o chamado grupo de risco seria as pessoas com mais de 60 anos, mais vulneráveis nessa faixa etária ao ataque do vírus.

Deixando de lado as questões éticas e de Direito que esta matéria suscita, cumpre notar o gravíssimo fato de que o presidente da República tendo 65 anos de idade está, tácita, implícita e ainda que inconscientemente, de público, afirmando que não pode permanecer exercendo as altas funções de presidente da República, nestas circunstâncias.

Trata-se, obviamente, de renúncia por vontade própria ainda que contrastando mas não excludente diante de suas atitudes violando as regras de quarentena, abraçando publicamente, seus simpatizantes.

Aliás, esta ambivalência solidifica o conflito que leva o presidente Jair Bolsonaro inclusive a discordar através de comportamento com seu Ministro da Saúde.

A Constituição Federal tem que ser interpretada de forma corajosa pois o espírito da letra nos esclarece:

Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.

Art. 83. O Presidente e o Vice-Presidente da República não poderão, sem licença do Congresso Nacional, ausentar-se do País por período superior a quinze dias, sob pena de perda do cargo.

Ora, ter que ficar confinado na sua residência no Palácio do Planalto sem contacto físico com qualquer pessoa redunda, escandalosamente, na inabilitação para exercer a função de presidente da República do Brasil.

André Montoro é cientista político formado pela USP.

 é advogado e mestre em Direito.

Revista Consultor Jurídico