Com propostas como “distritão” e emenda Lula, reforma política em debate no Congresso está feita sob medida para ajudar a perpetuar os políticos hoje com cargos

                 

 | Wilson Dias/Agência Brasil

                                   

O Congresso vai voltar a debater um projeto de reforma política na semana que vem, quando acabar o recesso parlamentar. Eles têm na mesa uma proposta do deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), que é relator da reforma e de uma proposta de emenda constitucional sobre o assunto. Vista nos detalhes, a proposta do deputado cai como uma luva para os parlamentares e partidos hoje no poder. Conheça sete pontos do projeto que garantem vida longa aos políticos de sempre:

Muito dinheiro

O pilar mais importante do projeto da reforma política é a criação do Fundo de Financiamento da Democracia (FFD), que garantirá bilhões em dinheiro público para as campanhas políticas. Em 2018, esse fundo teria R$ 3,6 bilhões do orçamento – que, somados ao tempo de TV e ao fundo partidário já existente, elevariam os recursos para os partidos para perto de R$ 6 bilhões. Para 2020 em diante, o fundo teria um pouco menos de dinheiro, em torno de R$ 2 bilhões.

Os políticos querem muito dinheiro. Como forma de comparação, esses R$ 3,6 bilhões custeariam quase sete meses de funcionamento da Polícia Federal, órgão que tem sido bastante afetado pelos cortes no orçamento. Também são necessários dois meses e meio de arrecadação com o tributo extra sobre a gasolina imposto pelo governo na última semana para pagar a conta.

                               

Muito dinheiro para quem

O segredo para a perpetuação no poder não está só no dinheiro, mas também na divisão do bolo. A ideia é que os partidos mais votados na última eleição e que têm hoje mais parlamentares recebam mais dinheiro. Isso vai beneficiar as três grandes legendas, PMDB, PT e PSDB. Estimativas mostram que o PT teria R$ 415 milhões e o PSDB, R$ 363 milhões. As regras estipulam que a campanha à presidência não custe mais do que R$ 150 milhões, valor que seria atingido por essas duas legendas sem a necessidade de outras doações. Com menos necessidade de doações, os caciques ganham poderes quase imperiais para decidir quem ganha mais ou menos na hora da campanha.

Sem dinheiro privado

Os partidos parecem não querer mesmo que candidatos entrem no jogo com dinheiro privado. A proposta na mesa é bastante restritiva às doações. Há um limite de dez salários mínimos para doações de pessoas físicas – diferente da regra atual, que permite doações até 5% da renda do ano anterior. Doações de pessoas jurídicas seriam proibidas. Com isso, vai ficar quase impossível para partidos novos e pequenos, como Rede e Novo, fazerem campanhas à Presidência.

                          

Sem autodoação

Outra restrição ao dinheiro privado é o uso da autodoação para cargos majoritários. Pelo texto da reforma, fenômenos como a eleição de João Doria (PSDB) à prefeitura de São Paulo seriam mais raros.

                              

Sem internet

Para garantir de vez que ninguém novo vai aparecer, o Congresso quer estipular um limite para gastos com campanha na internet. Seriam 5% do total gasto ou R$ 2 milhões, o que for menor. É isso mesmo, o jeito mais barato e eficiente de fazer campanha na atualidade teria um limite ridículo, para fechar de vez as portas aos novos partidos e candidatos. Sai o Facebook e voltam os velhos santinhos.

                                

“Distritão”

Para completar o pacote “mais do mesmo”, os deputados negociam nos bastidores um novo sistema eleitoral, batizado de “distritão”. Ele funciona assim: são eleitos os deputados federais e estaduais mais votados, independentemente das votações dos partidos. Isso torna a campanha mais cara (já que os candidatos buscam votos em estados inteiros) e dificulta o aparecimento de partidos com votações dispersas (com característica de movimentos). Beneficiam-se os candidatos já conhecidos da população. É verdade que na reforma política o sistema proposto é o distrital misto, mas ele não valeria para 2018. O que os deputados querem de verdade é o distritão para continuarem com o foro privilegiado.

                              

“Emenda Lula”

Corre por fora outra ideia estapafúrdia de autopreservação: a Emenda Lula. Ela foi assim nomeada porque beneficiaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A emenda prevê que os pré-candidatos façam seu registro eleitoral já em fevereiro. A partir do momento em que a habilitação é reconhecida pela Justiça Eleitoral, eles ganham imunidade, não podendo ser mais presos. Muita gente desconfia que essa habilitação abriria uma frente para a Lei da Ficha Limpa ser contornada. Candidatos habilitados continuariam no pleito ser forem condenados em segunda instância, como pode acontecer com Lula? Talvez sim.

                                             

Fonte: Gazeta do Povo, 25 de julho de 2017