Houve intensificação das diretrizes políticas e medidas legislativas do governo Temer, com destaque para a reforma da Previdência, redução de gastos públicos, elevação de alíquota previdenciária de servidores, redução de jornada dos servidores com salário proporcional, demissão de servidor público estável por insuficiência de desempenho e privatizações.

José Celso Cardoso Jr.*

Este artigo sintetiza e distingue as principais diretrizes da Administração Pública e da política de pessoal nos governos FHC, Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro.

No 1º mandato do governo FHC, houve um esforço concentrado de produção de documentos e diretrizes explícitas que tinham sua fundamentação no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, de 1995. A administração gerencial preconizava diretivas bem conhecidas:

1) autonomia financeira e administrativa de certas entidades públicas não estatais;

2) retorno do regime contratual-celetista para funções não essenciais de Estado;

3) generalização da avaliação de desempenho dos servidores;

4) possibilidade de demissão do servidor por insuficiência de desempenho e excesso de quadros; e

5) reorganização das carreiras especialmente nas funções essenciais do Estado, etc.

Algumas destas foram operacionalizadas mediante a EC 19/98. De forma paralela, a política de desestatização levou à criação das agências reguladoras, inicialmente nas áreas de telecomunicações e de energia elétrica, mas logo se estendendo à saúde e aos transportes. A medida mais significativa para a redução do pessoal ativo ocorreu por meio da contenção do número de ingressados por concurso público.

Simultaneamente, por parte dos servidores, houve uma corrida em busca da aposentadoria motivada pela expectativa de perdas salariais e de direitos.

No 2º mandato do governo FHC, em contexto de séria crise cambial, prevaleceu uma orientação fiscalista, caracterizada por fortes restrições ao gasto com pessoal. Tal orientação culminaria, em 2000, com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que consolidou vários dispositivos legais anteriores, como a Lei Camata, em vigor desde 1995.

De modo geral, entre 1999 e 2002, as prioridades fiscais se impuseram no campo da gestão de pessoal do setor público e tiveram poder predominante em relação às propostas de modernização do aparato administrativo de Estado. Por exemplo, na esfera federal, praticamente não houve admissão de novos servidores – nem mesmo para carreiras essenciais de Estado, antes tão incentivadas pelo plano da reforma administrativa.

Em contraposição ao primeiro mandato do governo FHC, as políticas de gestão de pessoal do setor público nos governos Lula (2003 a 2010) foram tratadas de modo muito sumário e em escassos documentos, talvez como reflexo mesmo de conflitos e ausência de consenso mais geral acerca da estratégia política a ser adotada.

Contudo, o novo cenário de crescimento da economia que surgiu em 2004 favoreceu o início de uma fase de recomposição de pessoal na administração federal, bem como a política de ajustes graduais de remuneração dos servidores.

Simultaneamente, decidiu-se pela reabertura de concursos públicos dirigidos para pessoal permanente e temporário em áreas prioritárias, incluindo carreiras estratégicas e as agências reguladoras.

Esses concursos tiveram como objetivo adicional substituir os chamados “terceirizados”, ou seja, os contratados informais de cooperativas e entidades privadas diversas, bem como os contratados por meio de agências internacionais.

Em vários momentos, desde o final do governo FHC, o compromisso de substituir os terceirizados por concursados foi firmado pelo Executivo com o Ministério Público (MP) e o Tribunal de Contas da União (TCU) mediante assinatura de Termos de Ajuste de Conduta (TAC).

Além disso, o governo Lula introduziu diversos aspectos inovadores na política de pessoal, tais como a adoção de mesas de negociação com servidores federais, no âmbito do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), que funcionaram com regularidade. Esse Ministério também se dedicou a formular novas bases para a autonomia gerencial da administração pública indireta.

Para tanto, foi elaborado projeto específico em torno da figura jurídica da Fundação Pública de direito privado (conhecida como Fundação Estatal).

Seguindo em direção similar, de apoio ao crescimento do espaço de autonomia administrativa e financeira da administração pública, foram divulgadas diretrizes produzidas por comissão de juristas que se prontificaram a trabalhar na montagem de proposta para o estabelecimento de uma nova Lei Orgânica da Administração Pública Federal, que não obstante, não chegou a avançar institucionalmente.

O governo Dilma deu prosseguimento a muitas das diretrizes de política de pessoal formuladas durante o governo Lula. No contexto dos desdobramentos internacionais da crise econômica de 2008, os sucessivos déficits fiscais levaram a adotar uma posição explícita de cautela em relação à continuidade do crescimento do estoque de servidores civis federais ativos.

No entanto, o resultado que se observa no período que vai de 2011 a 2015 em relação ao número de servidores concursados não tem correspondência com essa cautela de política fiscal. Em outras palavras, apesar de uma orientação geral mais restritiva no que concerne a novos concursos e reposição remuneratória, houve efetivação e nomeação de novos concursados decorrentes de certames e negociações aprovadas antes de 2011.

Não obstante, desde 2015, mas, sobretudo, desde a consumação do golpe em 2016, houve travamento na intensidade e quantidade de concursos, sob o pretexto da crise econômica em curso e sob a influência do processo de aprovação legislativa e implementação do chamado novo (ainda que pior!) regime fiscal, normatizado pela EC 95/2016. Desta maneira, durante o interregno Temer, houve suspensão de novos concursos públicos e revisão (visando contenção fiscal) dos acordos coletivos em torno às remunerações e reajustes salariais. Ademais, houve certa retomada de contratações atípicas (por exemplo, via organismos internacionais) e contratações à margem do RJU (por exemplo, via terceirizações).

A nova (e também pior!) orientação de governo e parlamentar buscou acelerar a tramitação de proposições legislativas, visando:

1) terceirização irrestrita no serviço público, inclusive das atividades finalísticas; e

2) flexibilização (visando facilitar e acelerar demissões) da estabilidade dos vínculos empregatícios no serviço público, tal qual previsto pelo RJU/CF-1988.

Por fim, quanto ao governo Bolsonaro empossado em 2019, basta dizer que o enxugamento das estruturas ministeriais que se observa na passagem dos governos Lula/Dilma para Temer/Bolsonaro representa não apenas um discurso de redução de gastos públicos sob uma ótica equivocada de ajuste fiscal, novamente em voga desde o golpe de 2016, mas, sobretudo, um desejo de reorientação programática das políticas e gastos públicos sob o comando de uma visão de mundo liberal-conservadora em termos ideológicos, como também anacrônica e reducionista em termos do peso e do papel do Estado na economia e na sociedade na contemporaneidade.

Desta forma, houve intensificação das diretrizes políticas e medidas legislativas do governo Temer, com destaque para a reforma da Previdência, redução de gastos públicos, elevação de alíquota previdenciária de servidores, redução de jornada dos servidores com salário proporcional, demissão de servidor público estável por insuficiência de desempenho e privatizações.

Tal agenda busca incorporar, ainda, os seguintes temas:

1) ampliação da possibilidade de contratação temporária no serviço público; e

2) reestruturação das carreiras dos servidores públicos federais.

(*) Doutor em economia pelo IE-Unicamp, desde 1997 é técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea. Atualmente exerce a função de presidente da Afipea-Sindical.

Diap