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Medida pode minar capacidade do SUS de lidar com mudanças

ANÁLISE

CLÁUDIA COLLUCCI

DE SÃO PAULO

 

Mesmo que o presidente Michel Temer garanta que os investimentos em saúde e educação serão mantidos, é compreensível o temor dos especialistas em torno da aprovação em primeiro turno da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que congela os gastos do setor público pelos próximos 20 anos.

A saúde pública brasileira já é cronicamente subfinanciada. O país gasta, por exemplo, metade do que a vizinha Argentina. São US$ 591 per capita ante US$ 1.167. Se compararmos com os Estados Unidos (US$ 4.307), a distância é muito maior.

A falta de recursos, associada a gestões ineficientes, reflete diretamente nas filas de espera para cirurgias eletivas, na falta de médicos e de medicamentos mais caros e outros insumos. Ou seja, qualquer real a menos terá implicações diretas no atendimento no SUS.

Sem contar que a saúde tem uma dinâmica própria. Sua "inflação" chega a ser quase o dobro da oficial, por fatores como a adoção de novas tecnologias e o envelhecimento populacional. Isso acontece em todo mundo.

A proposta do Planalto também ignora as muitas transições enfrentadas pelo país. A começar pela atual crise econômica, que está levando muita gente a perder seus empregos, e, obviamente, seus planos de saúde, e ter que bater nas portas do já superlotado SUS. No último ano, são quase 2 milhões de usuários nessa situação.

Uma das transições mais impactantes será a demográfica/epidemiológica. O Brasil está envelhecendo muito rapidamente, praticamente na metade do tempo que países como a França levaram para concluir esse processo.

A participação dos idosos na pirâmide populacional vai saltar de 12,1% para 21,5% nos próximos 20 anos. Teremos 35 milhões de brasileiros acima de 60 anos em 2035.

Com isso, a carga de doenças crônicas, como hipertensão, diabetes, artroses e o próprio câncer, deve aumentar muito os gastos em saúde e a necessidade de novos modelos de atendimento.

O custo per capita em saúde para maiores de 65 anos é de três a cinco vezes em relação a outras faixas etárias, segundo dados da OCDE.

O pior é que ainda nem resolvemos a carga das doenças infecciosas. As epidemias de zika, dengue e chikungunya estão aí para mostrar que não brincam em serviço.

Com eventuais cortes em saúde, a incorporação de novas tecnologias e tratamentos também deve sofrer um grande impacto, aumentando ainda mais o fosso que separa ricos e pobres nos cuidados em saúde.

Em entrevista à Folha em junho, David Stuckler, professor de política econômica e saúde pública na Universidade de Oxford (Reino Unido), disse que cortar despesas na saúde em tempos de recessão é um desastre porque há mais risco de surtos de infecções, retorno de doenças erradicadas, aumento dos índices de alcoolismo e suicídio.

À época, Stuckler deixou um recado: "Investir em saúde e bem-estar é uma oportunidade de retomada do crescimento, e eu espero que o governo brasileiro aprenda com essas lições da história para enfrentar a crise pela qual o país passa." 

Fonte: Folha de S.Paulo, 12 de outubro de 2016.

 

 

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