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O risco do radicalismo


A morte do cinegrafista Santiago Andrade, fruto da inaceitável violência dos black blocs, revela o despreparo da polícia para lidar com extremistas e coloca o País diante do desafio de conter o vandalismo sem atentar contra liberdades democráticas

Um dos principais militantes anarquistas do século XIX, Sergei Nechaev criou em 1869, em Moscou, o grupo terrorista Narodnaya Rasprava, que pregava a realização de atos de assassinato de grandes figuras políticas e práticas de terrorismo contra a burguesia e a imprensa com o objetivo de estimular insurreições populares. Exatamente um século depois, em dezembro de 1969, inspirados nas ideias de Nechaev, grupos terroristas da Itália, com a pretensão de desestabilizar a ordem política do pós-guerra, promoveram uma ação que ficou conhecida como o “Atentado à Piazza Fontana”, detonando uma bomba que destruiu o Banco Nacional de Agricultura, em Milão, matou 16 pessoas inocentes e deixou outras 88 feridas. Nada disso, afora a inspiração anarquista dos atos e o clamor popular que se seguiu às mortes na Itália, se assemelha ao que ocorreu há duas semanas no Rio de Janeiro. Na quinta-feira 6, o cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da TV Bandeirantes, que registrava o confronto entre manifestantes e policiais durante protesto contra o aumento da passagem de ônibus, no centro da cidade, foi atingido na cabeça por um rojão lançado por dois integrantes do grupo Black Bloc – linha de frente das manifestações que lançaram o Brasil, desde junho do ano passado, na maior convulsão social experimentada em décadas. Em consequência do ataque, Andrade sofreu afundamento do crânio e faleceu na segunda-feira 10.

Convém delimitar bem os dois episódios para não se cometer equívocos históricos que resultem em diagnósticos errados e embalem soluções políticas inapropriadas. O que se configurou na Itália em 1969 foi puro ato de terrorismo, no sentido preciso da palavra, porque sua intenção era a de provocar terror, morresse quem morresse, uma criança ou um homem, jornalista ou político. No Rio, a situação foi outra. Na esteira das manifestações de junho passado, quando a sociedade tomou as ruas demonstrando um mal-estar difuso, vândalos e arruaceiros, muitos deles influenciados por ideais punks e anarquistas, como os black blocs, se apossaram dos movimentos e promoveram radicalismos inaceitáveis, criminosos, mas que, nem de longe, podem ser classificados como ações terroristas que ameaçam a ordem institucional do País. A democracia brasileira segue firme.

Rede de conspirações
Investigação sobre a morte de cinegrafista sugere que ativistas seriam bancados por partidos, mas isso, além de carecer de comprovação, não explica o problema

As investigações sobre as circunstâncias da morte do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Ilídio Andrade, de 49 anos, aprofundadas na última semana em meio ao clamor popular gerado pela tragédia, fizeram suscitar teses que apontam para várias direções, mas que, até agora, carecem de comprovação. Não restam dúvidas da participação dos dois acusados, Caio Silva de Souza e Fabio Raposo, no acionamento do rojão que vitimou o cinegrafista. Ambos estão presos e indiciados por homicídio doloso qualificado com dolo eventual e crime de explosão. Na sexta-feira 14, o delegado Maurício Luciano, titular da 17ª DP (São Cristóvão), entregou o relatório final do inquérito que apura o caso para a Promotoria de Investigação Penal do Ministério Público. Nele, constam provas robustas do envolvimento dos dois. Entre elas, o depoimento do próprio Caio, que admitiu que colocou o artefato no chão, depois de pegá-lo, já aceso, das mãos de Raposo. Acompanham o relatório laudos do esquadrão antibombas sobre o artefato, laudo cadavérico do cinegrafista, perícia do local, além de depoimentos de testemunhas e do amigo de Caio, que trabalhava com ele no hospital. O amigo confirmou ter ele ligado no dia da manifestação ofegante dizendo que havia feito uma besteira e teria matado um homem.

Outra vertente da apuração, porém, que sugere o financiamento das manifestações por políticos e partidos ainda está perdida em densa nebulosidade. Num primeiro momento, o advogado Jonas Tadeu Nunes, que defende Caio, acusou o deputado Marcelo Freixo (PSOL) de ter ligação com o seu cliente e afirmou que seu cliente recebia R$ 150 para cometer atos de vandalismo durante os atos públicos. Dois dias depois, desculpou-se com Freixo e reconheceu que o suposto pagamento ao manifestante deveria ser “melhor apurado”. Ao longo da semana, além de Freixo, o ex-governador Anthony Garotinho, adversário do atual governador Sérgio Cabral, foi apontado como suposto financiador de protestos.

Corrida contra o tempo
Depois de 16 anos, Procuradoria confirma as provas do mensalão mineiro, pede 22 anos de prisão para o deputado Eduardo Azeredo e o processo caminha para um desfecho no STF. Os outros réus, no entanto, ainda aguardam manifestação da Justiça de Minas

Adormecida durante 16 anos, a Ação Penal 536, que envolve o chamado mensalão mineiro, esquema de arrecadação irregular de recursos para a campanha eleitoral do PSDB para o governo de Minas em 1998, revelado por ISTOÉ em 2007, acaba de chegar à sua fase final. Na semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao STF uma denúncia de 84 páginas contra o deputado e ex-governador tucano de Minas Gerais Eduardo Azeredo. Ele é o principal personagem do processo e em 1998 tentava a reeleição para o comando do Estado. Em sua denúncia, o procurador reafirma todas as revelações feitas por ISTOÉ, acusa Azeredo de peculato e lavagem de dinheiro e pede uma pena de 22 anos de prisão – superior, por exemplo, à de Delúbio Soares, José Dirceu, José Genoíno e  João Paulo Cunha, para ficar nos integrantes do chamado núcleo político da AP 470, o processo do mensalão do PT. Na quinta-feira 12, o ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no STF, declarou que vai julgar a Ação Penal 536 com “o máximo de isenção e empenho”.

A pena tão alta contra Azeredo se justifica por uma razão que não se encontra nos autos. É que a AP 536 caminhou tão devagar que agora se transformou numa corrida contra o tempo. O ex-ministro Walfrido dos Mares Guia, por exemplo, um dos réus no processo, já se favoreceu com a prescrição e nem sequer será julgado. Como a decisão judicial será tomada 16 anos depois dos fatos ocorridos, qualquer condenação inferior a 20 anos permitirá que Azeredo deixe a Suprema Corte sem receber nenhuma punição prática, pois a denúncia estará prescrita. O fato de o julgamento ocorrer ainda no primeiro semestre, porém, pode trazer uma repercussão política em ano de disputa eleitoral. Os petistas avaliam que, no mínimo, uma condenação de Azeredo poderá reduzir os danos provenientes das condenações dos líderes do PT na AP 470. No PSDB, o raciocínio é diferente. Segundo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ainda que seja provada a existência de crimes no mensalão mineiro, ele não se refere a uma operação que contamine o partido, mas a um suposto esquema isolado na campanha de Azeredo.

Fonte: Revista IstoÉ

 

 

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