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Manifestações refletem crise de mediação de partidos e entidades, afirmam especialistas

Faltou meio de campo. Se fosse futebol,  a resposta para entender as manifestações que tomaram o país nas últimas semanas seria essa. Para os especialistas em análise social e política ouvidos pela RBA, a questão é a falta de mediação institucional dos anseios da sociedade. Partidos e instituições que davam vazão às vontades populares deixaram de cumprir esse papel, e agora, além de não entenderem o povo, são alvo de violenta antipatia. Na manifestação que reuniu milhares de pessoas na Avenida Paulista, em São Paulo, no dia 20, bandeiras de partidos e movimentos sociais de esquerda foram queimados. Ativistas foram agredidos e impedidos de prosseguir em marcha.



A crítica vem da própria esquerda, que reconhece avanços nos 10 anos de governo federal do PT, mas entende que é necessário garantir novas conquistas e romper certa acomodação.“O lulismo talvez não funcione mais. A capacidade de sintonia com a rua, acho que isso é o que está em questão. Não quer dizer que a direita ganhou. Não foi ela a fazer isso”, acredita o sociólogo e diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Cândido Grzybowski.



“Aumentou a 'arrogância institucional' em relação ao sucesso do Bolsa Família, ganhos do salário mínimo. E, ao mesmo tempo, houve a desqualificação de lutas, a mais recente delas a dos indígenas. Isso alimentou um caldo que afirma que a voz dos insatisfeitos não é ouvida”, afirma Grzybowski.



Ele analisa que apenas o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) tentou alguma renovação nos últimos anos, acrescentando à pauta o agronegócio e a produção de alimentos, com mais apelo popular, em vez de ficar preso na questão do grande latifúndio. E aponta que, no vácuo deixado pelas entidades tradicionais, igrejas evangélicas têm canalizado as vontades da população mais pobre. “Não é à toa que eles têm ocupado tantos espaços políticos.”



A crise de legitimidade dos partidos, no entanto, não é exclusiva do Brasil, afirma o sociólogo Leôncio Martins Rodrigues, da Unicamp. “Em um dado momento essas manifestações de rua, que são muito positivas em termos de aumentar a participação, vão encontrar problemas na fase da institucionalização. Como eles vão concretizar as demandas que são abstratas? Vão ter de passar por um processo que vai terá de ser discutido no Congresso. Não dá pra discutir em praça pública”, aponta.



Para Rodrigues, no entanto, a solução para a insatisfação não passa pela criação de novos partidos. “Já temos demais. Então é preciso ficar mais atento ao comportamento dos políticos, isso sim. Mas a ideia de que podemos funcionar sem partidos é uma ilusão negativa. Eles são necessários e precisam ser bons”, afirma.



Ele ressalta que, diferentemente de outros momentos, as diversas reivindicações estão relacionadas à prestação de serviços públicos, como saúde, educação e transporte, e não materiais ou econômicas, como o aumento de salários. “Talvez pela presença de jovens de classe média”, acredita.



A ex-professora de História da USP, Maria Victoria Benevides, também aponta a diminuição de legitimidade de políticos eleitos e não acredita em ações orquestradas para produzir manifestações. "Não é uma força organizada que faz isso. É uma demanda em face da incapacidade das instituições de captar essas angústias”, afirma, e inclui a mídia entre as instituições que não estão em sintonia com as pautas reais da população.

A professora entende que o processo é positivo, mas, ao mesmo tempo, traz riscos. “É bom, porque tira as ideias do lugar. Mas pode vir um oportunista e se apresentar como salvador da pátria. É uma possibilidade, mas eu não vejo ninguém assim.”

Para Grzybowski, a disputa é por quem vai canalizar as vozes das ruas. “A direita não tem condições de capitalizar um 'troço' deste tamanho. Ela não tem história para isso. Estamos diante de uma crise de hegemonia, sem dúvida. Quem achava que tinha o sentimento da rua não está tendo. Acho que a partir disso vamos ter muitas formas de pequenas lutas, em uma dispersão desordenada”, aposta.

 

 

 

 

 

 

FONTE: Rede Brasil Atual, 26 de junho de 2013

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